O Conselho Tutelar estava ciente das suspeitas de agressões a criança de 4 anos morreu no último domingo (17) em Florianópolis. A investigação ainda apura se ela era vítima de maus-tratos. De acordo com informações da Polícia Civil, o menino ficou internado por 12 dias no Hospital Infantil Joana de Gusmão em maio, ocasião em que a mãe registrou um boletim de ocorrência e o órgão público, encarregado de zelar pelo cumprimento dos direitos da criança e do adolescente, foi chamado. Em nota (veja abaixo), o órgão diz que não pode divulgar detalhes sobre o caso e lamenta a morte da criança.

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O menino morreu no último domingo após dar entrada no MultiHospital, no Sul da cidade, desacordado. Ele estava com uma mordida na bochecha, manchas roxas no abdômen e marcas de agressões nas costas. A mãe e o padrasto foram presos em flagrante por suspeita de maus-tratos.

Neste segunda-feira (18), a mulher, que está grávida, foi solta com aplicação de medidas cautelares após passar por uma audiência de custódia. O homem teve a prisão em flagrante convertida para preventiva.

Mãe suspeitava da babá

No dia 10 de maio, havia registro hospitalar de persistência de manchas na pele do menino em suspeita de maus-tratos. Na ocasião, a mãe alegou que trocou de babá “embora novamente tenha deixado o filho sob os cuidados do companheiro”, destaca trecho do relatório da Polícia Civil.

Em 22 de maio, a criança deu entrada novamente na emergência do Hospital Infantil Joana Gusmão “com equimoses na face, orelhas, abdome e lábios, além de sinais de escoriações ‘de defesa nas mãos e na face’, quadro clínico que o médico classificou como fortemente sugestivo de maus-tratos”.

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Já no dia seguinte, 23 de maio, a mãe fez um boletim de ocorrência e afirmou, em depoimento à polícia, que desconfiava de uma babá em relação aos casos de agressões, mas nunca do companheiro. Na declaração de óbito da criança consta que a mulher tinha pleno conhecimento dos episódios de maus-tratos sofridos pelo menino.

O diretor de Polícia da Grande Florianópolis, Pedro Mendes, em entrevista à NSC TV, afirmou que havia um registro na mesma época na Delegacia de Proteção à Criança, Mulher e ao Idoso (Dpmcami), onde um inquérito policial havia sido instaurado, que ainda apurava a autoria das agressões. O Conselho Tutelar foi acionado na ocasião.

Em nota, o Conselho Tutelar de Florianópolis informou que os atendimentos prestados pelo órgão são sigilosos, “podendo ser requisitado apenas pelas autoridades competentes, como Ministério Público ou Poder Judiciário”. Ainda, os conselheiros da Capital informaram que não podem divulgar detalhes sobre o caso, a fim de não comprometer as investigações em andamento.

Conforme o laudo, a causa da morte da criança foi choque hipovolêmico decorrente de múltiplos traumas provocados por ação contundente, com a presença de lesões no corpo, “circunstância que reforça a natureza violenta e cruel das agressões sofridas pela criança”. Dessa forma, ainda segundo o documento, “as provas indicam que a criança foi espancada paulatinamente ao longo de meses até a sua morte”.

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Em nota (veja abaixo), a defesa da mãe da criança informou que ela está “muito abalada e precisa de acolhimento neste momento, não de julgamentos precipitados”. Questionada pelo NSC Total, a defesa do padrasto preferiu não se manifestar.

A criança tinha completado 4 anos na última sexta-feira, dia 15 de agosto.

Profissionais sobrecarregados

A morte, quase três meses depois do registro de ocorrência e do acionamento do Conselho Tutelar, chamou a atenção da 9ª Promotoria de Justiça da Comarca da Capital, responsável por atuar na área da Infância e da Juventude. De acordo com a promotoria, os profissionais que atuam nessa rede estão sobrecarregados.

— A gente ouve nas reuniões que fazemos com os conselheiros que existe muito trabalho e falta de estrutura de servidores pra apoiar no serviço deles. Percebemos um relato de que os conselheiros têm vontade de fazer as coisas, mas enfrentam muita dificuldade — diz a promotora Luana Pereira Neco da Silva.

O Ministério Público de Santa Catarina (MPSC) informou nesta segunda-feira que vai instaurar um procedimento interno para apurar se houve falhas na rede de atendimento do caso por parte dos órgãos de proteção à criança e ao adolescente:

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— É um procedimento que, a princípio, vai colher informações acerca do que foi feito neste caso. Eventualmente, após a vinda dessas informações, verifica se há necessidade de ajuste na prestação de serviço, o que falhou, e o principal é que se evitem novos casos como esse. Mas eventualmente também se verifique responsabilidades acerca das falhas no caso.

Entenda o caso

O caso aconteceu por volta das 15h30min de domingo, quando o menino foi levado desacordado para o MultiHospital, no Sul da cidade, em parada cardiorrespiratória. Em relato à NSC TV, os vizinhos contaram que ele passou mal e foi levado por uma moradora, que é enfermeira, e pelo padrasto à unidade.

Ao dar entrada no hospital, os profissionais perceberam que ele tinha uma mordida na bochecha, várias manchas roxas no abdômen e marcas de agressões nas costas. Durante o transporte, a vizinha tentou fazer uma manobra de reanimação, mas o menino não resistiu e chegou já sem vida ao local.

Segundo a polícia, em depoimento, o padrasto, de 23 anos, informou que notou que a criança estava estranha durante o domingo. Quando o menino ficou desacordado, ele foi até a casa da vizinha pedir ajuda. Já a mãe da criança, de 24 anos, relatou que estava no trabalho.

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No entanto, os profissionais teriam constatado a presença de lesões no corpo da vítima, o que levantou a suspeita de outras agressões. Ainda de acordo com a polícia, o padrasto também apresentou um comportamento considerado estranho durante o atendimento.

Por conta desses indícios, o casal foi preso em flagrante e encaminhado à delegacia. Além da PM, o Conselho Tutelar, a Delegacia de Homicídios e o Instituto Médico Legal (IML) estiveram no local para perícia.

O que diz o Conselho Tutelar

“É com profundo pesar que recebemos a notícia do falecimento de uma criança de 4 anos, com suspeita de maus-tratos. 

Ressaltamos que todo e qualquer atendimento realizado pelo Conselho Tutelar é sigiloso, podendo ser requisitado apenas pelas autoridades competentes, como Ministério Público ou Poder Judiciário. O artigo 137 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) estabelece que as decisões do Conselho Tutelar somente podem ser revistas pela autoridade judiciária, ou seja, pelo Juiz da Vara da Infância e da Juventude. Dessa forma, em respeito a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) e ao próprio (ECA) – Estatuto da Criança e do Adolescente não podemos divulgar detalhes sobre o caso, a fim de não comprometer as investigações em andamento. 

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O Conselho Tutelar é um órgão encarregado de zelar pelo cumprimento dos direitos da criança e do adolescente e, quando necessário, adota medidas administrativas de proteção. Destaca-se que não compete ao Conselho Tutelar investigar crimes ou suspeitas de crimes, atribuição esta exclusiva dos órgãos de segurança pública. 

É fundamental, como sociedade, estarmos atentos aos sinais e as suspeitas de violências cometidas contra crianças e adolescentes. Situações como agressão física, verbal, psicológica, negligência ou abuso sexual envolvendo criança ou adolescente, devem ser comunicadas às autoridades policiais e ao Conselho Tutelar, ou via Disque 100 nos termos das Leis 8.069/90, 13.431/2017, 14.344/2022. O Conselho Tutelar da Região Sul de Florianópolis permanece à disposição das autoridades competentes para fornecer eventuais registros de atendimentos, caso for solicitado. 

Florianópolis/SC, 18 de agosto de 2025 COLEGIADO AMPLIADO CONSELHO TUTELAR”.

O que diz o Ministério Público

O Ministério Público de Santa Catarina (MPSC) por meio da 9ª Promotoria de Justiça da Comarca da Capital, que possui atribuição para atuar na área da Infância e da Juventude, informou que será instaurado procedimento próprio a fim de identificar se houve falha no atendimento do caso por parte dos órgãos de proteção à criança e ao adolescente.

O Ministério Público entende que é necessário o fortalecimento da rede de proteção de crianças, principalmente a nível municipal, a fim de que os sinais de violência contra crianças e adolescentes sejam percebidos e tomadas as medidas necessárias com a urgência que o tema exige.

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A rede de proteção é composta por diversos órgãos que atuam nas diversas áreas de direitos de crianças e adolescentes, sobretudo na educação, na saúde e na assistência social, serviços em que as violências são comumente identificadas e devem, por obrigação legal, ser comunicadas às autoridades e ao Conselho Tutelar.”

O que diz a SES?

“A Superintendência Hospitalar da Secretaria de Estado da Saúde (SES) esclarece que, durante atendimento na rede hospitalar estadual, sempre que há suspeita de que um paciente possa ter sido vítima de qualquer tipo de violência, é realizada a notificação compulsória, com a imediata comunicação aos órgãos competentes, incluindo a Vigilância Epidemiológica Municipal, Estadual e o Conselho Tutelar da cidade de origem.

Em relação ao paciente mencionado, a direção do Hospital Infantil Joana de Gusmão esclarece que todos os protocolos vigentes referentes à violência foram rigorosamente cumpridos. A notificação foi realizada em 23 de maio de 2025″.

O que diz a defesa da mãe do menino

“A defesa técnica informa que, a mãe em luto pela perda irreparável de seu filho, foi colocada em liberdade provisória com parecer favorável do Ministério Público.

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Ressaltamos que o processo tramita em segredo de justiça, razão pela qual não podemos divulgar maiores informações, entretanto, salientamos que a conduta a ela imputada, pela Autoridade Policial, é de omissão imprópria, não de ação direta contra seu filho e que sequer existe nos autos laudo pericial atestando a causa da morte.

[A mãe] está grávida, muito abalada e precisa de acolhimento neste momento, não de julgamentos precipitados. Confiamos que no decorrer do processo a verdade será demonstrada e a justiça prevalecerá”.

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