Diana Boccara e Leo Longo estão uma temporada em Florianópolis e participam da 24ª edição do Festival de Cinema Florianópolis Audiovisual Mercosul (FAM), onde compartilham a experiência de vida e profissional adotada há seis anos. O casal de artistas visuais, após alguns anos trabalhando na produção e direção de conteúdos para canais de televisão, trocou a segurança do salário no fim do mês pela experiência de encaixar o estilo de vida dentro do orçamento de produções autorais e criativas pelo mundo.
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O primeiro projeto saiu do papel em 2014. “A volta ao mundo em 80 videoclipes” fez com que o casal viajasse por quase dois anos filmando em mais de 20 países. Adaptando a ideia inicial que foi de custo elevado, Diana e Leo venderam o que tinham e investiram as economias para colocar em prática o que haviam desenhado. Quando o projeto estava na estrada, empresas e marcas que havia negado apoio resolveram se unir à produção.
O resultado positivo deu energia para o casal seguir com o estilo de vida que está diretamente relacionado com a vida profissional que escolheram. Sem residência fixa, rondam o país e o mundo atrás de boas histórias e construindo a própria história. Santa Catarina, mais precisamente a Praia do Campeche, tem sido o refúgio escolhido, há três anos, para o momento de criação dos projetos do duo Couple of things, como se identificam nas redes sociais.
Neste ano, o período que residem no Estado coincide com a 24ª edição do FAM. Diana e Leo irão compartilhar as experiências em projetos de baixo custo e colaborativos com universitários e recém-formados em cinema, audiovisual e comunicação, no Rally Universitário, que faz parte da programação do festival. Eles serão mentores na produção de cinco videoclipes de até cinco minutos, rodados, editados e finalizados em 100 horas contínuas durante o evento, que iniciou na última quinta-feira, dia 24, e segue até o dia 30 de setembro.
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O FAM 2020 é o primeiro grande evento internacional que acontece em Florianópolis neste ano e acontece, até 30 de setembro, totalmente on-line. Filmes, palestras, oficinas e debates serão exibidos na plataforma de streaming Innsaei.tv. A programação completa e os ingressos para o festival estão disponíveis no www.famdetodos.com.br.
Na entrevista a seguir o casal conta um pouco da história que será compartilhada no evento:
Felicidade, dinheiro e propósito de vida, como isso se conecta para vocês?
Leo – Escolhemos trabalhar na área da televisão e artística porque sempre gostamos muito desse universo de produzir programas de TV, curtas e outros tipos de formatos. Então, a escolha da profissão sempre esteve muito ligada com o propósito da felicidade. Só que quando nos conhecemos em 2012, dois anos depois, tivemos a ideia de fazer um projeto nosso, e essa relação com o propósito, com a felicidade e com o dinheiro mudou bastante. Quando a gente se predispôs a fazer um projeto autoral e independente, foi preciso repensar diversas coisas para que o nosso objetivo fosse possível.
Nessa nova jornada teríamos que repensar o valor profissional que davam para gente, então aquele salário de diretor que me pagavam, antes de 2014, para os projetos que realizava para canais fechados e abertos, eu teria que abrir mão. Teríamos que investir para poder realizar e o contrário. No nosso primeiro projeto, o “A volta ao mundo em 80 videoclipes”, não recebíamos, o que tínhamos era o que servia para bancar a vida e isso aos poucos foi nos mostrando que mesmo na ausência do salário, do cachê e do lucro, poderíamos ficar felizes.
Produzindo conteúdo ao mesmo tempo em que o propósito estava sendo cumprido e recompensado nos deixava muito feliz e foi um momento em que essa equação se apresentou de forma diferente. É engraçado que nessas situações em que estamos extremamente satisfeitos com que estamos fazendo e feliz com o resultado o dinheiro começa a perder a importância. Perde o valor intangível, óbvio que o valor da unidade monetária continua igual, mas o valor intangível começa a se perder.
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Fomos percebendo isso nos 18 meses dessa volta ao mundo e quando voltamos a equação trabalhar muito e receber pouco, nos fazia mais feliz. É meio um paradoxo que a gente descobriu nessa viagem e que a gente segue até hoje. Somos minimalistas, vivemos com pouco, não só por uma questão de querer ter pouco, mas por uma questão prática. A vida que levamos, de não ter casa e de ser itinerante pelo mundo, ter pouco é uma necessidade. Isso nos permite ser móvel e estar onde quiser, no tempo que for.
Como o projeto “A volta ao mundo em 80 videoclipes” saiu do papel?
Diana – Na verdade a gente criou o projeto no início de 2014, e a ideia inicial era fazer um programa, algo mais robusto, era a gente recebendo um cachê. Passamos sete meses batendo em empresas, marcas e emissora de TV e ouvindo vários nãos. Mas eles vinham com bons feedbacks, que eram: “ah, que projeto incrível”, “que ideia inovadora”, mas ao mesmo tempo o negativo e com algumas questões que nos fizeram reformular e ir enxugando o para conseguir realizar.
Só queríamos que aquela ideia saísse do papel, não queríamos ganhar dinheiro. Quase desistimos, colocamos como prazo de início do projeto em março de 2015 e não daria mais tempo. Só que ao mesmo tempo as bandas que estávamos convidando para o projeto começaram a topar. A primeira que topou foi a banda Patu fu, a segunda a Vanguart. Bom, daí pensamos que a ideia poderia ser realmente boa. Em janeiro reunimos todas as nossas economias e pensamos: “ninguém quer apostar na nossa ideia, não tem problema, a gente acredita”. O dinheiro não era suficiente para passar 18 meses na estrada, mas as coisas começaram a acontecer.
Leo – Quando a Diana fala que começou a dar certo, é que as empresas que tínhamos ido atrás antes, começaram a ver que estávamos fazendo e começaram a nos procurar para estar junto no projeto. Quando falou sim para o projeto é como se estivéssemos emanado uma fonte de positividade e essas empresas começaram a nos dar retorno, e no total foram umas 15 empresas, então foi um começo bem animador.
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Além de criatividade, é necessário muito planejamento?
Diana – Eu e o Leo somos muito diferentes nesse aspecto. Ele está há anos luz na frente, ele faz planejamento financeiro, de vida, de onde vamos morar e o que vamos fazer. Temos sim um planejamento, mas ele não é tão a longo prazo. Aprendemos que não adianta planejar muito, porque vivemos em universo cheio de variações, que nos fazem ficar replanejando o tempo inteiro.
Leo – Acho que mais que planejamento para viver dessa forma, é necessário objetivo. Colocar metas e dizer “quero daqui três meses viabilizar o projeto x”. É isso que nos faz sustentar esse estilo de vida, traçar os passos necessário para atingir o objetivo.
Diana – Também estamos sempre abertos ao inesperado e as coisas improváveis que aparecem e que podem ser grandiosas, mas que poderíamos não aproveitar se tivéssemos um planejamento fixo.
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Vocês vivem o que para muitos é um sonho. Como mantêm isso?
Leo – Acho que é justamente o contrário, porque sonho para a maioria das pessoas é ter coisas, casas, qualidade de vida, plano de saúde, roupas… A gente já teve tudo isso, mas o ponto é que a nossa percepção do que é necessário para a nossa vida mudou e não conseguimos mais entender como era antes. Hoje, por exemplo, cada um de nós tem duas malas. Ter menos significa gastar muito menos do que se imagina. A nossa vida de ganhos e rendimentos não tem que se encaixar numa estrutura de vida que escolhemos, com carros, apartamento e compras. Vivemos o contrário. A gente vê quanto vai ter no próximo mês e analisa para reduzir gastos e encaixar as contas. Isso é que muda.
Diana – As pessoas não prestam atenção em algo muito importante, elas trabalham para ganhar dinheiro para bancar as coisas que elas têm. Mas se você parar para pensar que quanto menos coisas você tiver, menos dinheiro vai gastar para manter e, por consequência, irá trabalhar menos e terá mais tempo para fazer coisas que gosta. A gente vive uma vida assim, temos tudo que a gente precisa, mas vive dentro de um custo que varia sempre, porque optamos por isso. Falando praticamente, o que fazemos é criar projetos que depois oferecemos a marcas ou emissoras de TV. Dentro do orçamento colocamos o custo de realização do projeto, que normalmente também é o valor do nosso custo de vida, porque quando estamos filmando alguma série, estamos vivendo naquele lugar, então o trabalho e a nossa vida são praticamente a mesma coisa.
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Vocês trabalharam por muito tempo atrás das câmeras, mas os novos projetos apresentam a Diana e o Leo. Como foi esse processo de expor a vida de vocês como profissionais e como casal?
Diana – Sinceramente, acho que nunca imaginamos que viraríamos personagens da nossa própria história até começarmos a contar. Acho que foi um processo muito orgânico. Vivemos os dois mundos, normalmente estamos atrás das câmeras em projetos que envolvem outros artistas, mas estamos na frente da câmera porque somos nós os narradores dessas histórias.
Leo – Não foi uma transição abruta. Foi coerente. Sempre trabalhamos na indústria da televisão, inclusive com reality, então de alguma forma sabíamos como se posicionar e como falar. Dá para mostrar a sua vida, mas não mostrar tudo, preservar a intimidade. Outra coisa, é que quando tomamos a decisão de fazer os próprios projetos, as redes sociais já eram uma realidade, já estávamos acostumados com essa exposição pessoal. E outra, quando você faz algo muito legal e tem orgulho quer mostrar para as pessoas.
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O que a pandemia mudou nos planos de vocês?
Leo – Tínhamos um ano com diversas coisas planejadas, mas nenhuma delas foi possível. Primeiro porque todos os nosso projetos e séries, até então, estavam ligados a colaboração artística, e isso exigia contato presencial. Segundo, os nossos projetos estão vinculados com a ideia de não estar no mesmo lugar sempre, esse movimento faz parte dos pilares dos nossos projetos. São duas coisas centrais e fundamentais que se foram. Sobrou a criatividade, valor e requisito básico para fazer o que a gente faz.
Diana – A pandemia mudou os planos de muitas pessoas, mas ela não nos impediu de criar. Mesmo com um espaço limitado, com poucos objetos e opções, nós nos reinventamos e criamos conteúdos e séries, foi muito rico e criativo pra gente.
Florianópolis já era o destino antes da pandemia?
Leo – Floripa tem sido frequente nos nossos últimos três anos. Passar o inverno aqui é nosso momento de respiro, é um momento que fica tudo muito vazio, mais lento e precisamos dessa frequência nesse período do ano que definimos para criar novos projetos, então foi o encaixe perfeito. Outra razão: o custo de vida em Floripa no inverno é muito mais baixo que no verão e muito mais barato que outras capitais brasileiras na mesma época.
Diana – Outra coisa que avaliamos quando vamos escolher o lugar para morar é a qualidade de vida. Além de todas as questões que o Leo falou. Hoje pela manhã saí, e temos saído muito pouco de casa, duas vezes na semana para correr e de máscara, e cheguei à praia e pensei, que sorte tenho de estar aqui. Porque estar aqui no Sul da Ilha numa tranquilidade, perto da praia, ouvindo passarinho, no terreno vizinho tem pé de abacate e pitanga, estar aqui faz muito bem para nossa saúde mental.
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Como será a participação de vocês no rally universitário e qual a importância de fomentar a produção audiovisual?
Leo – Nos últimos dois anos temos visto uma redução nos investimentos para a produção artística e consequentemente audiovisual, o que lamentamos. Porque a arte significa poder mostrar para as pessoas como se inspirar, evoluir e como estar preparado para enfrentar qualquer tipo de desafio. Lamentamos ver que o fomento está cada vez mais prejudicado, então contribuímos com isso, compartilhando nossa experiência com baixo orçamento e colaboração voluntária.
Diana – Nossa participação será tentar dividir ao máximo com os participantes formas de eles repensarem os conteúdos que vão produzir durante o rally, fazer com que eles pensem de forma diferente. Fomos convidados porque esse ano o tema é videoclipe e temos um histórico de mais de 100 clipes, boa parte deles em plano sequência e sem orçamento.