É assim desde 1908, quando foi criada a Diocese de Florianópolis: novembro é mês para homenagear a padroeira do Estado, Santa Catarina de Alexandria. Catarina nasceu em 287 numa família de origem aristocrata, no Egito. Era filha de um imperador e de uma princesa, sendo uma jovem bonita, inteligente e eloquente. O nome Alexandria refere-se à cidade onde viveu, grande centro comercial e cultural da Antiguidade. Foi radical na forma de professar sua fé. O martírio, aos 18 anos, é consequência da violenta perseguição aos cristãos no século IV.

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Na Catedral Metropolitana, a programação se inicia no dia 16 e culmina com procissão na tarde de 25, dia da santa, patrona da Arquidiocese e cotitular da Catedral. Também é conhecida como Santa Catarina da Roda, já que foi esse o instrumento usado para executar a sua sentença de morte.

Por essa analogia, ainda que oficialmente considerada padroeira dos filósofos e dos universitários, é invocada por mecânicos, timoneiros, costureiras e por outras profissões que trabalham com maquinário com roda.

— O dia 25 de novembro não é feriado municipal em Tangará, no Meio-Oeste, porém, as empresas de papel que utilizam máquinas com rodas param as atividades em honra à padroeira — explica Patrícia Fiorese, do setor de ouvidoria da Prefeitura.

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Também ocorrem celebrações religiosas e atividades de confraternização entre funcionários. O mesmo ocorre no município vizinho Pinheiro Preto, que cresceu às margens do Rio do Peixe, e onde trabalhadores das fábricas suspendem as tarefas por um dia.

Relíquias retiradas do osso da costela têm 1733 anos

Em Florianópolis, existem três relíquias da santa – na capela ecumênica do Tribunal de Justiça, na Igreja Ortodoxa Grega São Nicolau, no Centro da cidade, e na Catedral Metropolitana. Isso torna a capital catarinense um dos poucos lugares do mundo, fora do Egito, com tão significativas relíquias de “primeira classe”, ou seja, aquelas retiradas do próprio corpo da santa.

Na capela do TJ e Igreja Grega encontram-se fragmentos da costela direita da santa e que têm 1733 anos. Na Catedral Metropolitana, a relíquia foi inserida no altar principal, um presente recebido em 2022 da Arquidiocese de Milão, na Itália. Apesar de tantas reverências, a santa não é considerada muito popular. Para o padre Dyego Delfino, vigário geral paroquial, existe uma explicação.

— A reforma litúrgica de 1969 retirou Santa Catarina de Alexandria do calendário romano. O argumento foi que faltavam documentos que efetivamente comprovem a sua existência. No entanto, em 2002, foi feita uma revisão e ela retornou ao Missal Romano. Hoje, retomamos o louvor com muita devoção — explica.

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Foi o bispo da época, dom Joaquim Domingues de Oliveira, quem pediu ao Vaticano que tornasse Santa Catarina padroeira diocesana. Por um decreto de 26 de julho de 1922, o Papa Pio XI a declarou padroeira principal da Arquidiocese de Florianópolis, e copadroeira da Paróquia Nossa Senhora do Desterro.

Catarina de Alexandria faz parte do seleto grupo dos 14 santos auxiliares da Igreja Católica, ou seja, aqueles para os quais correm os cristãos em casos de necessidade especial.

Para gregos ortodoxos, sentimento de presença do Monte Sinai

A santa é também venerada como mártir pela Igreja Ortodoxa Grega. Ocorre que, à época do nascimento de Catarina, o Egito tinha uma grande população de origem grega. Para o monsenhor André Sperandio, reitor paroquial da Igreja Ortodoxa Grega de São Nicolau, a relíquia trazida do Monte Sinai, no Egito, e que o templo guarda, tem uma importância imensurável. Extrapola o aspecto da fé, da cultura e da própria história.

— É como se Santa Catarina de Alexandria estivesse aqui — diz.

O processo da transferência das relíquias de Santa Catarina de Alexandria para Florianópolis foi deflagrado no ano 2000. Na ocasião, o então governador Esperidião Amin recebeu uma comitiva da Igreja Ortodoxa Grega, liderada pelo arcebispo de Buenos Aires, monsenhor Gennadios, dando início às tratativas.

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Para que ocorresse a transferência das relíquias foi construída a Capela Ecumênica de Santa Catarina de Alexandria, no Tribunal de Justiça do Estado. A inauguração foi em 23 de novembro de 2001, como parte da programação do Dia de Santa Catarina.

Sobre a chegada das relíquias, pelas mãos do monsenhor Angelos Kontaxis, o jornal Diário Catarinense escreveu na edição de 22 de outubro:

De um sarcófago de mármore instalado no interior da igreja do Monastério de Santa Catarina, localizado ao pé do Monte Sinai, no nordeste do Egito, Monsenhor Angelos Kontaxis, pároco da Igreja Grego-Ortodoxa do Brasil em Florianópolis, trouxe preciosas relíquias de Santa Catarina de Alexandria, a padroeira do Estado e da Arquidiocese (Católica Romana) de Florianópolis”.

Desde então, uma valiosa parte dos restos mortais da padroeira repousam no coração da Ilha de Santa Catarina.

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Professor destaca personalidade forte que torna santa admirável

O professor João Lupi, pós-doutor em Filosofia pelo Boston College, é autor de dois livros sobre Catarina de Alexandria: “Santa Catarina de Alexandria – A Padroeira dos Estudantes e do Estado de Santa Catarina” e “A jovem princesa de Alexandria e Santa Catarina: A origem de seu nome”. Ambos foram destinados ao público infantil e editados em parceria da UFSC e Secretaria de Estado da Educação, no ano de 2004.

Nas duas edições publicadas, o autor conta com linguagem acessível e bonitas ilustrações sobre a história da santa. A tiragem foi pequena e restrita a algumas escolas. Para ele, não existem dúvidas sobre a escolha do nome do estado catarinense.

— Concordo totalmente com a visão do professor Nereu do Vale Pereira, autoridade na história de Santa Catarina: o nome foi dado em homenagem a Santa Catarina de Alexandria. A devoção do império marítimo português por ela era muito grande — explica.

Com invejável conhecimento na área de Filosofia, com ênfase em História da Filosofia e atuando principalmente nos temas Filosofia Medieval e Patrística, Lupi foi “seduzido” pela inteligência e coragem da santa supostamente egípcia. Além de um quadro na parede da sala, tem uma coleção com 19 imagens, livros, documentos, fotografias e desenhos da santa.

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— Eu não sei explicar o meu amor por Santa Catarina. Mas posso dizer que, depois da minha mulher, é a segunda paixão. Eu não penso se está no céu, se está aqui. Ela é dona de uma personalidade que atrai. Até brinco com as pessoas: tome cuidado que se você ler muito e buscar informações, ela vai te atrair de uma forma muito forte — conta.

Para Lupi, nas últimas décadas, alguns historiadores, artistas e literatos começaram a divulgar o nome da santa por meio da poesia, da pintura (Albertina Prates) e de quadros murais (Rodrigo de Haro).

— Apesar disso, ainda é pouco. Imagine que o selo da Universidade de Paris tem ela como símbolo. É preciso pensar quem foi essa moça, símbolo da cultura cristã, que dá nome ao Estado e é admirada pelos cristãos.

Decreto antecipando Data Magna de SC não ofuscou homenagens

A veneração dos fiéis católicos e gregos ortodoxos catarinenses manteve-se mesmo depois do ‘sequestro’ da Data Magna de Santa Catarina, alterando a Lei nº 10.306, de 1996, que instituiu a data magna do Estado de Santa Catarina como 25 de novembro.

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Em 2004, acatando recomendações de historiadores, o governador Luiz Henrique (1940-2015) decidiu antecipar a data do Estado para 11 de agosto (Decreto 12.906, de 22/1/2004), alusiva ao dia em que Santa Catarina tornou-se Província independente de São Paulo, no ano de 1738.  Passou-se, então, a considerar a Data Magna do Estado o dia 11 de agosto, Dia do Estado de Santa Catarina.

O dia de “Santa Catarina de Alexandria” continua sendo celebrado no dia 25 de novembro no Estado de Santa Catarina, mas não mais como data magna. Apesar disso, os católicos seguem com novena, na Catedral Metropolitana, e com procissão com a imagem da santa pelas ruas do Centro.

A programação completa pode ser acessada pelas redes sociais (@catedralfloripa).

Veja imagens relacionadas à Santa Catarina de Alexandria

Curiosidades sobre a vida da santa

Rica, bonita e inteligente

Catarina viveu na cidade de Alexandria, no Egito, no início do século IV (300). Era de origem aristocrática, dona de grande beleza física e profunda sabedoria. Recebeu uma educação refinada, sendo instruída por alguns dos mais renomados mestres da época, como quiseram o pai, o imperador Costus, e a mãe, a imperatriz Sabinela. Aos 12 anos teve um sonho revelador sobre se fazer “esposa do Rei Altíssimo, o Salvador do mundo”.

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Perseguida, firme e corajosa

Mas era o tempo das perseguições aos cristãos. Foi caçada pelo imperador Maximino Daia, a quem confrontou ao defender pessoas por ele condenadas. Foi aprisionada em uma masmorra, onde era humilhada, espancada, chicoteada e martirizada pelos soldados que cumpriam as ordens de Maximino, que a queria como esposa.

Manteve-se na fé e negou-se a cultuar os deuses romanos. Recebeu sentença de morte. A imagem de Santa Catarina de Alexandria é representada por três símbolos: a roda (sentença), a espada (instrumento definitivo da execução) e a palma (do martírio).

Santa Catarina da Roda

Também é conhecida como Santa Catarina da Roda, já que foi esse o instrumento usado para executar a sua sentença de morte. Foi amarrada em uma roda dentada com outra roda girando em sentido contrário. Assim, o corpo seria trucidado. Mas um raio teria atingido o instrumento de tortura, matando os soldados que a carregavam, enquanto ela sobreviveu.

Enfurecido, o imperador a enviou novamente à prisão por mais 12 dias, sem água nem comida, para que aceitasse se casar com ele. Diante da negativa, Maximino ordenou que fosse decapitada por uma espada. Nesse momento, um sinal divino aconteceu: no lugar de sangue, jorrou leite do corpo.

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Anjos carregam o corpo

O corpo teria sido transportado por anjos ao Monte Sinai. O saudoso padre Ney Brasil Pereira em seu livro “Santa Catarina de Alexandria” destaca que, “os ‘anjos’ que transportaram o seu corpo até o Sinai teriam sido os próprios monges, embora o paradeiro inicial das relíquias, no topo do monte Gebel Katarin, a 2.500 metros de altitude, tenha até justificado a ideia do transporte angélico. O fato é que as relíquias, depois de certo tempo, encontraram seu lugar definitivo na basílica mosteiro, chamado de Santa Catarina.

Padroeira dos pensadores e das rendeiras

Santa Catarina é padroeira dos filósofos. A origem dessa fama se deve a um fato do imperador Maximino querer demovê-la da sua fé com argumentos intelectuais. Decidiu, então, chamar cerca de 20 dos maiores pensadores de Alexandria para submetê-la a um “provão”. Além de não a convencer, todos decidiram se tornar cristãos. Indignado, o imperador ordenou que os sábios fossem queimados vivos. Catarina também é invocada por bibliotecários, estudantes, rendeiras, timoneiros e por todos que trabalham com rodas.

Um nome e suas referências

Na Idade Média, os portugueses e espanhóis singraram os mares. Em 25 de novembro de 1526, Sebastião Caboto aportou em Meiembipe, como diziam os Carijó, batizando o lugar de Santa Catarina. Há uma polêmica: o nome homenageia a santa ou seria uma referência a esposa dele, dona Catarina Medrano?

O saudoso jornalista Carlos Damião acrescentou outra informação em um de seus textos: “Outra controvérsia, menos aceita pelos historiadores acerca do nome, é de que o fundador de Nossa Senhora do Desterro, hoje Florianópolis, teria sido o autor da homenagem. Dias Velho fundou Desterro por volta de 1673, mas o fato é que o local já era conhecido como Ilha de Santa Catarina. Tendo sido um, ou tendo sido outro, o fato é que Santa Catarina de Alexandria tornou-se, ao longo do tempo, a padroeira do Estado”, escreveu Damião, falecido em novembro de 2022.

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Vida em Alexandria, cidade dos palácios de Cleópatra

Cidade de Alexandria

Alexandria localizava-se na foz do rio Nilo, no Egito. Era uma cidade muito importante no mundo antigo. Famosa por suas riquezas artísticas, arquitetônicas e culturais. Foi considerada a segunda maior cidade do mundo, um lugar que cultivava o conhecimento. Foi em Alexandria que a rainha Cleópatra, nascida no ano 69 a.C, construiu palácios memoráveis.

Biblioteca e farol

A cidade de Alexandria teve obras importantes: a biblioteca com mais de 500 mil volumes e o Farol de Alexandria, que era uma das sete maravilhas do mundo antigo com 137 metros de altura, e destruído por um terremoto. Além de livros, a biblioteca tinha um acervo com documentos, manuscritos, papiros, e setores com centros de pesquisa, laboratórios, zoológico, jardim botânico.

Manuscritos em 13 línguas

Uma das áreas mais preservadas do Mosteiro Santa Catarina no Egito é a biblioteca. Ela contém 4.570 manuscritos com iluminuras; 7 mil livros impressos na idade média; 6 mil livros novos. O lugar conserva manuscritos em 13 línguas. São 730 folhas de pergaminho, corresponde a pele de 360 cabras. O manuscrito mais famoso é o Codex Sinaiticus ou Bíblia do Sinai do século IV, é a mais antiga edição bíblica.

Maomé visita o local

Uma das curiosidades do mosteiro é que em 15 séculos nunca foi atacado. O próprio Maomé visitou o mosteiro e recomendou que os muçulmanos não atacassem o lugar. Mais tarde, a região caiu nas mãos dos turcos, que também mantiveram a proteção. Muito tempo depois, a península do Sinai foi conquistada por Napoleão. Mas a proteção ao mosteiro foi garantida.

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Mesquita, sinagoga e igreja

Na região do mosteiro convivem as três grandes religiões: há uma mesquita dos muçulmanos, uma sinagoga dos judeus e a igreja da Transfiguração dos cristãos. Também é uma região em que foram localizados episódios bíblicos.

Oração

Ó Santa Catarina de Alexandria, que a tua sabedoria e coragem nos inspirem a viver com a mesma determinação e fé que demonstraste. Intercede por nós, para que possamos enfrentar nossas provações com a mesma bravura e confiança em Deus. Que o exemplo de tua vida nos guie em nosso caminho de fé, fortalecendo nossa devoção e compromisso com o Senhor. Amém.

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