A palavra comorbidade serve para designar problemas de saúde concomitantes a uma doença que podem potencializar danos. Na pandemia de Covid-19, tem sido aplicada em contexto mórbido por si só, desumanizando pacientes e famílias enlutadas, como bem observou a colega Dagmara Spautz.
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De uma perspectiva social, o novo coronavírus também encontra comorbidades que reduzem a chance de sairmos dessa crise sem graves sequelas. Em Santa Catarina, resta evidente que a (má) política vem agravando o número de mortes e prolongando os prejuízos econômicos.
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O governador Carlos Moisés distancia-se do dilema de prefeitos compelidos a restringir a circulação de pessoas. Argumenta que os municípios pediram autonomia, no que tem razão. Em abril, sob forte pressão de empresários, deputados e também de prefeitos preocupados com a reeleição, ele aceitara delegar o combate à pandemia.
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Em julho, uma vez que perderam o controle da situação, os chefes políticos municipais descobriram a parte ruim da autonomia. Enquanto Moisés distribuía decretos, havia para onde apontar quando o eleitor reclamava. Depois, reabrir as cidades com poucos casos e mortes foi moleza. Agora, com os dedos todos na direção deles, prefeitos culpam a “população”, esse coletivo intangível e insondável, mas teimosamente irresponsável.
Preferem a gangorra de um abre-fecha, com todos os prejuízos humanos e econômicos inerentes, a restringir a circulação de pessoas pra valer. Sucumbem a qualquer pressão com potencial de dano às campanhas eleitorais de logo mais. Isso quando não brincam com a ignorância da população, divulgando as maravilhas de medicamentos duvidosos.
Tudo isso sem contar o presidente da República, que abdicou de governar o país ciente de que a crise econômica na garupa do coronavírus poderá lhe custar a reeleição. Sabotou politicamente o Ministério da Saúde, permitiu que governadores, o Supremo e o Congresso assumissem protagonismo e passou a fazer oposição às medidas adotadas, colecionando bodes expiatórios.
Não estivéssemos vivendo a pior pandemia dos últimos 100 anos, a pequeneza política seria normalizada. Num contexto político-eleitoral, faria sentido Moisés “retaliar” jogando parado ou os prefeitos diluírem responsabilidades de modo a culpar todos e ninguém ao mesmo tempo. Faria sentido também Bolsonaro empurrar a culpa pela crise a quem supostamente o impediu de tomar as decisões, digamos, “certas”, embora ninguém saiba exatamente quais seriam.
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No momento em que Santa Catarina precisa dramaticamente de lideranças responsáveis, a política virou comorbidade da Covid-19. Porque piora o quadro. Em lugar de liderar a guerra contra o inimigo comum, agentes que dependem de votos dividem a sociedade para conquistá-los. Nada disso pode ser normalizado. Nem esquecido.