A decisão do presidente Jair Bolsonaro de deixar o partido que o elegeu e guiar seus deputados fiéis para uma nova legenda é inédita em nível nacional, mas tem ar de déjà-vu para os catarinenses. Foi o que fez Raimundo Colombo em 2011, primeiro ano de seu mandato como governador de Santa Catarina, quando trocou o DEM pelo PSD levando praticamente todas as lideranças demistas da sigla no Estado para a nova legenda.
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Daquela experiência podemos lembrar que todo esse processo tem três etapas: a construção do racha, a própria decisão e a construção jurídica da migração sem prejuízo aos mandatos conquistados. Em 2011, Colombo completou as três etapas com sucesso e conseguiu levar para o PSD todos os três deputados federais e sete deputados estaduais eleitos pelo DEM em 2010. De quebra, cerca de 50 prefeitos que fizeram dos pessedistas uma das principais forças políticas do Estado do dia pra noite – e, no mesmo movimento, transformaram o tradicional DEM em nanico na terra catarinense.
Voltando ao momento atual, à crise do PSL e à iminente saída do presidente Jair Bolsonaro da sigla, estamos vivendo a segunda etapa do processo: a decisão. A construção do racha foi o momento iniciado com o vazamento do conselho de Bolsonaro a um correligionário pernambucano para esquecer o PSL. Desde então ficou explícita a briga interna pelo controle do partido entre os bolsonaristas e o grupo que se aproximou de Luciano Bivar, o cacique que emprestou a legenda a Bolsonaro ano passado. Temos acompanhado essa depuração entre quem fica com o presidente em qualquer condição e quem não pretende deixar a sigla – o governador catarinense Carlos Moisés neste segundo grupo.
Alinhado à Moisés, o deputado federal e presidente estadual da sigla Fábio Schiochet também permanece. Na reunião marcada por Bolsonaro na tarde desta terça-feira em que deve anunciar a debandada, ele é o único da bancada do PSL-SC que não foi convidado. Repete-se a cena de sábado em Criciúma, quando Eduardo Bolsonaro tomou café com Caroline de Toni, Coronel Armando e Daniel Freitas – os que acompanharão Bolsonaro.
Após a reunião deve ser concluída a segunda etapa, a da decisão – anunciada por Bolsonaro. É a mais breve, apesar de todo o simbolismo. A mais longa e mais difícil, como ensinou a bem-sucedida travessia de Colombo do DEM para o PSD, é a construção jurídica da fuga. Em 2011, a lei eleitoral ainda permitia aos deputados que migrassem para novas legendas carregassem consigo os minutos de horário eleitoral e os milhões de fundo partidário equivalentes. Atualmente, ainda é permitido migrar para um partido recém-criado, mas de mãos vazias. Para uma legenda que já existe, é preciso comprovar justa causa na Justiça Eleitoral.
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Essa é a construção que começa a partir de agora. Com a briga em praça pública, não há confiança entre os bolsonaristas de que Bivar e Schiochet assinem cartas de liberação para que os deputados federais e estaduais eleitos pela sigla possam deixá-la sem perder os mandatos. É uma briga que vale milhões, fora o interesse dos suplentes.
Ex-ministro do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o advogado Admar Gonzaga é um dos responsáveis pela construção jurídica da saída dos bolsonaristas do PSL – seja para um partido novo ou para adesão a um nanico qualquer disposto a abrigar o grupo. O limite para uma legenda ser criada a tempo de participar das eleições do ano que vem é abril. Para manter mandatos, minutos e milhões, Gonzaga vai criar a argumentação de que fundo partidário e tempo de televisão decorrem do mandato do eleito e se houver justa causa na saída, é “justo” que sejam levados com o parlamentar.
Se a tese vai colar, saberemos apenas nos tribunais. Mas há outra coincidência entre a diáspora pessedista de Colombo e a saída de Bolsonaro e seus fiéis do PSL: Admar Gonzaga também construiu a solução jurídica para o PSD em 2011.
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