O nome do governador Carlos Moisés da Silva (PSL) apareceu pela primeira vez nas investigações da Operação Oxigênio, que apura irregularidades na compra de 200 respiradores com pagamento antecipado de R$ 33 milhões pelo governo do Estado.
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As menções ao governador fizeram com que a investigação fosse remetida ao Superior Tribunal de Justiça (STJ). Moisés tem foro privilegiado e processos que apurem crimes cometidos pelo governador devem ser julgados no STJ. A decisão foi divulgada nesta segunda-feira (22).
A investigação identificou três menções ao governador Carlos Moisés em conversas por aplicativo dos investigados na operação. A informação consta na decisão em que o juízo da 1ª Vara da Fazenda Pública da Comarca da Capital declina da competência para seguir com o caso e remete o processo ao STJ.
A primeira menção ao governador Moisés aparece em uma conversa de Samuel de Brito Rodovalho, que era representante da empresa Cima, e Germano de Lins Lincoln, também investigado na operação. Germano foi citado em depoimento da CPI dos respiradores na semana passada como um amigo de um representante da empresa Brazilian International Business, de Joinville, sondada para importar os respiradores para o governo do Estado, mas que desistiu do negócio depois de receber um pedido de propina de R$ 3 milhões feito por Samuel.
Na conversa entre Samuel e Germano, ocorrida dia 26 de março, o representante da Cima encaminha uma mensagem recebida de uma terceira pessoa: “O quw eu faço com fovernador menligando??????”.
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Em depoimento, Samuel disse que recebeu a mensagem de César Augustus Martinez Thomaz Braga, diretor jurídico da Veigamed e um dos intermediários que atuou pela empresa na venda dos respiradores ao governo do Estado. Disse ainda que César Augustus teria “contatos políticos” e que não sabia a qual governador ele se referia na mensagem, mas que não estavam negociando à pronta entrega com governos de outros Estados.
Em mensagens seguintes, segundo a investigação, César relatou a Samuel que órgãos do governo estariam pressionando para que a proposta fosse apresentada. Samuel também reencaminhou as mensagens a Germano. César Augustus foi um dos cinco presos na segunda fase da Operação Oxigênio, em 6 de junho.
Segunda menção aparece em áudio de intermediador
A segunda menção ao termo governador aparece na continuação dessas conversas. Em um áudio reencaminhadas de Samuel para Germano, um interlocutor pergunta a César Augustus se houve algum problema na compra dos 200 respiradores e diz que “o Governador já tinha liberado o processo de aquisição e já tinha mandado pra Secretaria da Fazenda pra solicitar os dados de conta pra fazer depósito”. A conversa é do dia 26 de março, um dia antes de o governo fechar a compra com a Veigamed via dispensa de licitação.
Em interrogatório na última quarta-feira (17), César Augustus disse que o áudio foi repassado por Deivis de Oliveira Guimarães, que teria sido o responsável por apresentá-lo a Fábio Guasti, principal nome da Veigamed na negociação com o Estado – também preso preventivamente desde o último dia 6 de junho.
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Na conversa, ao responder a Germano de quem era o áudio citando o governador, Samuel responde que seria do “secretário de Saúde”. Segundo a investigação, isso confirmaria que se trata de Deivis porque ele atuou como secretário de Saúde nos municípios de Presidente Kennedy (ES), Anchieta (RS) e Itabuna (BA). O nome de Deivis também aparece como um dos que teriam recebido comissão da empresa de Fábio, após o Estado depositar os R$ 33 milhões à Veigamed. Em depoimento, Deivis disse que não negociou nem intermediou a venda de respiradores ao Estado de SC.
Terceira menção ocorreu após pagamento antecipado
A terceira menção ao governador que aparece na investigação e que motivou a remessa do caso ao STJ ocorre novamente em conversa entre Samuel e Germano pelo aplicativo Whatsapp. Desta vez, no entanto, o diálogo ocorre em 2 de abril, um dia após o governo do Estado fazer o pagamento antecipado dos R$ 33 milhões, mas data em que o valor ainda não havia caído na conta da Veigamed. Por isso, segundo a investigação, os intermediários da empresa faziam pressão para que o pagamento ocorresse – especialmente Fábio Guasti.
Questionado por Germano, que dizia que sem o pagamento eles iriam “perder as máquinas lá com os China”, Samuel respondeu em mensagem de texto dizendo que estava indo atrás do assunto: “na linha com o governador”.
Os investigadores também citam outros fatos ligados ao então secretário da Casa Civil, Douglas Borba, próximo do governador Carlos Moisés, para justificar o pedido de envio da investigação ao STJ, que foi aceito pelo juízo da Comarca da Capital.
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Denúncias foram citadas em grupo com o governador
Outro ponto utilizado pelo Ministério Público para incluir o governador Moisés na investigação é uma troca de mensagens localizada no celular do ex-secretário de Saúde, Helton Zeferino. A perícia feita na semana passada mostrou um grupo no WhatsApp chamado “Gestão da crise Covid19”, que incluía Zeferino, Paulo Eli (secretário da Fazenda), Jorge Eduardo Tasca (secretário de Administração), Douglas Borba (então chefe da Casa Civil), Alissom de Bom de Souza (Procurador-Geral do Estado), Márcio Ferreira (Chefe de Gabinete) e o governador Moisés.
No grupo, o próprio Moisés encaminhou no dia 28 de abril a reportagem do portal The Intercept Brasil que revelou naquele dia a compra dos 200 respiradores. O governador encaminhou o link da publicação com a mensagem “Agora a SES [Secretaria de Estado da Saúde] vai precisar falar sobre o assunto”. Na sequência, Moisés envia outra mensagem listando medidas possíveis por parte do governo, como bloqueio de bens, restituição dos valores pagos, ruptura de contrato e medida judicial para entrega imediata.
Conforme a perícia que consta no pedido do MP, após as mensagens de Moisés os secretários discutem sobre a emissão de uma nota oficial à imprensa sobre o caso. O secretário Tasca questiona se houve pagamento antecipado à Veigamed, e Douglas Borba responde: “Sim. Manter a discrição em relação a isto”. Nenhum outro participante do grupo questiona a fala de Borba pedindo para o pagamento não ser divulgado.
Contrapontos
O governador Carlos Moisés concedeu entrevista coletiva no fim da tarde desta segunda-feira (22) e negou conhecer os investigados que citaram o governador em diálogos pelo celular. Moisés disse que seriam “ilações” feitas “sem sequer citar o nome do governador” e que os nomes dos investigados eram “desconhecidos de todos os catarinenses”, e também dele.
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Afirmou ainda que soube dos primeiros problemas em 20 de abril e iniciou medidas para recuperar os valores. E disse que espera que o STJ analise com celeridade o caso.
– Pedirei celeridade porque o interesse é do cidadão Carlos Moisés da Silva, que o mais rápido possível isso seja esclarecido.
O advogado Nilton Macedo, que responde pela defesa de Samuel Rodovalho, afirmou que Samuel não conhece e nunca teve nenhuma conversa ou ligação com o governador Carlos Moisés. O advogado também afirmou que a empresa que ele representa não vendeu nenhum respirador para o Estado.
A reportagem não conseguiu contato com os advogados de Germano de Lins e Lincoln e César Augustus Martinez Thomaz Braga.
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