Mais de R$ 4,5 milhões já foram gastos pela prefeitura de Itajaí para a compra de medicamentos preventivos ao coronavírus sem qualquer eficácia comprovada por pesquisadores.

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O maior investimento — alvo de questionamentos do Tribunal de Contas de Santa Catarina (TCE) — foi com a ivermectina. Além dos 3 milhões de comprimidos adquiridos, a gestão passou a distribuir cânfora à população e agora planeja ter um laboratório de ozônio, que será aplicado via retal, o que causou polêmica nas redes sociais.

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O dinheiro é uma fatia dos R$ 37, 5 milhões utilizados entre março e início de agosto no enfrentamento à pandemia. Deste total, R$ 5,2 milhões são recursos próprios, os demais são verbas federais e estaduais recebidas.

A medidas alternativas começaram com a cânfora no final de abril, logo após o início da flexibilização das atividades comerciais. Foram 150 mil frascos comprados por R$ 150 mil. Um questionário online avaliou o resultado do tratamento homeopático. Segundo o relatório (que não tem validação científica), pessoas que tomaram o remédio apresentaram 21,8% menos sintomas de Covid-19 do que aquelas que não tomaram. 

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Itajaí se destaca devido a uma das consequências mais amargas da pandemia: a de óbitos. Em todo o Vale do Itajaí é o município com o maior número de mortes pelo coronavírus (105 até esta terça-feira, conforme dados do governo do Estado). Em Santa Catarina é a quinta em número de infectados (3.855, ainda de acordo com dados estaduais desta terça).

Depois da cânfora, o município investiu na distribuição da ivermectina — medicamento antiparasitário que, segundo os defensores, previne o novo coronavírus. Pouco mais de 1,5 milhões dos 3 milhões de comprimidos já chegaram aos moradores interessados no tratamento. Para a distribuição das três doses necessárias as equipes das unidades de saúde e do Centreventos exigem receita médica. 

Segundo o portal da transparência da prefeitura, mais de R$ 210 mil foram desembolsados para promover a ação. O valor custeou serviços de limpeza, segurança, tapetes, separadores de fila e outros itens necessários para a distribuição da ivermectina, que começou em julho.

Tribunal questiona valor pago

Com a ivermectina foram R$ 4,4 milhões para a compra de 3 milhões de comprimidos. As notas fiscais foram emitidas em julho e geraram questionamentos do TCE. Por meio de decisão singular, o conselheiro Herneus de Nadal estabeleceu prazo de 30 dias para que o prefeito, Volnei Morastoni e o secretário de Saúde, Emerson Duarte, esclareçam três pontos sobre a compra.

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A Corte de Contas quer que o município explique a ausência de elementos que justifiquem a quantidade de medicamentos adquiridos, fragilidades na dispensa de licitação e possível sobrepreço. O levantamento constatou que a prefeitura pagou R$ 1,47 por unidade, que teria valor médio de R$ 0,28. Além disso, apontou excedente de 1,3 milhão comprimidos, levando-se em consideração que a distribuição seria feita a 110 mil pessoas.

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O conselheiro aponta fragilidades na dispensa da licitação, gerando dúvidas em relação à lisura do procedimento. Ele expõe na decisão possível direcionamento na pesquisa de preços, sendo que apenas uma empresa era apta ao fornecimento do quantitativo pretendido, quando poderia ter sido ampliada a pesquisa para outras empresas de porte compatível com o volume procurado.

Outro ponto questionado é sobre os parâmetros científicos que embasaram o entendimento da eficácia do remédio e o cálculo da dosagem, resultando na compra de grande quantidade do medicamento.

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Em nota, a prefeitura disse que “tem prestado todos os esclarecimentos solicitados e que está à completa disposição das autoridades para elucidar quaisquer questionamentos, bem como garantir a total transparência de suas ações”

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Tratamento com ozônio

A prefeitura está em processo de inscrição para participar de um estudo multicêntrico da Associação Brasileira de Ozonioterapia (Aboz) para avaliação da ozonioterapia em pacientes com coronavírus. A pesquisa irá analisar o impacto do uso da terapia nas taxas de recuperação e de evolução para o não agravamento de pacientes positivos.

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A pesquisa já está sendo feita no Brasil, em outros centros cadastrados e com os mesmos procedimentos, tanto em âmbito hospitalar quanto ambulatorial.Itajaí é mais um interessado no estudo e está organizando a documentação para se inscrever. 

Para isso, a prefeitura irá implantar um ambulatório para tratamento de pacientes com sintomas leves a moderados da Covid-19 com a ozonioterapia de forma complementar. Ainda não há data prevista para o início do estudo no município.

Azitromicina e hidroxicloroquina

Também alvo de polêmicas e questionamentos da comunidade científica quanto ao uso em pacientes com coronavírus, a azitromicina e hidroxicloroquina já constavam no estoque do município. Porém, devido à alta demanda, foi necessário realizar novos processos de licitação para aquisição dos remédios.

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Depois de comprar mais de 80 mil comprimidos de azitromicina entre junho e julho (R$ 192 mil), recentemente foi feito um pregão de 200 mil comprimidos, que serão adquiridos conforme a demanda da cidade. Também foi realizada a compra de 14 mil comprimidos de hidroxicloroquina. Para retirar ambos na farmácia municipal e unidades de saúde é necessário apresentação de receita médica.