O Supremo Tribunal Federal (STF) inicia nesta terça-feira (2) o julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e de outros sete réus da chamada trama golpista. As possíveis consequências, em caso de condenação, vão desde a prisão até a perda de direitos políticos.

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Bolsonaro responde por acusações de “liderar” o chamado “núcleo 1” da trama, organização criminosa acusada de atuar em um “projeto autoritário de poder”, com o objetivo de dar um golpe de Estado. A denúncia do Ministério Público Federal (MPF) inclui cinco crimes: organização criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, dano qualificado pela violência e grave ameaça contra o patrimônio da União e, por fim, deterioração de patrimônio tombado.

Para cada um dos cinco crimes que Bolsonaro é acusado, haverá uma avaliação específica. Isso significa que os ministros podem condená-lo por alguns deles e absolvê-lo por outros, com um veredito que será aplicado separadamente a cada acusado.

A defesa de Bolsonaro afirma que ele é inocente e não compactuou com qualquer tentativa de ruptura democrática. Durante interrogatório no STF em junho, Bolsonaro admitiu ter discutido “alternativas” para sua derrota eleitoral em 2022, mas negou veementemente qualquer investida golpista. Segundo seu testemunho, o plano não prosperou e as alternativas foram descartadas por falta de “clima”, “oportunidade” e “base minimamente sólida para qualquer coisa”.

Entenda a situação atual de Bolsonaro

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Prisão imediata?

O julgamento caberá à Primeira Turma da Corte, composta por cinco ministros: Alexandre de Moraes, Luiz Fux, Cármen Lúcia, Flávio Dino e Cristiano Zanin. O colegiado é considerado uma instância final e há espaços limitados para recursos.

Há cenário jurídico para execução imediata da pena se houver condenação. Havendo condenação sem espaço para embargos, é possível que a execução comece logo após o fim do julgamento. No entanto, de acordo com o advogado constitucionalista e penalista André Figueira Cardoso, a prisão imediata após o julgamento é improvável.

— Eu acredito que não acontecerá nesse momento, porque muito embora a previsão de recursos seja bastante limitada, ainda assim existe um certo espaço. Eu consigo pensar na possibilidade de pelo menos dois recursos: os embargos de declaração e os embargos infringentes. Então, eu acredito que prisão só viria depois do esgotamento de, pelo menos, essas possibilidades de recurso — declarou o especialista à Rádio Nacional.

O embargo infringente é um recurso que a defesa pode utilizar e para tentar alterar a decisão da Corte, desde que haja pelo menos dois votos pela absolvição.

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Dosimetria

Em caso de condenação, outro fator decisivo será a “dosimetria” da pena – o cálculo final que definirá sua duração. A soma teórica das penas máximas de todos os crimes chega a 43 anos.

O cálculo real, no entanto, é complexo e realizado em três fases: primeiro, os ministros estabelecem a pena-base, considerando antecedentes, culpabilidade e motivação; depois, avaliam agravantes ou atenuantes da conduta de cada réu; por fim, na terceira fase, analisam outras causas especiais que possam alterar a pena.

O regime de cumprimento inicial depende da soma das penas: se a condenação for até quatro anos, o regime é aberto. De quatro a oito, o regime é semiaberto. E para penas maiores de oito anos, o regime é fechado.

Local de prisão

Uma condenação que resulte em regime fechado para Bolsonaro abrirá um novo capítulo de discussão no STF: o local onde o ex-presidente cumpriria a pena. Entre as alternativas, estão uma cela especial no presídio da Papuda, em Brasília, ou a Superintendência da Polícia Federal no Distrito Federal, que já tem sala preparada para custódia individual. Além disso, ministros do STF não descartam a possibilidade de prisão domiciliar. 

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A defesa pode pleitear a manutenção desse regime, invocando sua idade (70 anos) e seus problemas de saúde de conhecimento público. Desde o atentado com faca em 2018, o ex-presidente passou por sete cirurgias abdominais e, recentemente, enfrentou crises severas de soluço, chegando a declarar em julho que “vomitava dez vezes por dia”.

— Toda pessoa que recebe uma condenação, em tese, deveria ter o direito de receber um tratamento diferenciado a depender das suas condições de saúde, fazer juízo desse benefício chamado prisão domiciliar humanitária — diz Cardoso.

Inelegibilidade

Além da prisão, outra consequência de uma eventual condenação será a inelegibilidade. Bolsonaro já está impedido de disputar eleições até 2030 devido a uma condenação no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). No entanto, uma nova pena, proferida por um órgão colegiado como a Primeira Turma do STF, reforçaria e estenderia essa situação.

Pela Lei da Ficha Limpa, a inelegibilidade de oito anos é contada a partir do término do cumprimento da pena.

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Adicionalmente, ele perderia outros direitos políticos. De acordo com a legislação eleitoral brasileira, apenas presos provisórios mantêm o direito ao voto.

Um cenário similar ocorreu com o ex-presidente Lula em 2018, que, preso em Curitiba, além de ter sua candidatura barrada, não pôde votar na eleição vencida por Bolsonaro.

Veja como será o julgamento

  • Sessões: cinco dias de julgamento, com possibilidade de duas sessões em três deles, totalizando até 27 horas de análise;
  • Votos: ministros apresentam votos e, se necessário, pedem vista (o que poderia alongar o desfecho);
  • Condenação ou absolvição: se condenado por parte ou por todos os crimes, passa-se à dosimetria da pena;
  • Embargos: só existem infringentes se houver dois ou mais votos divergentes;
  • Trânsito e execução: sem embargos (ou após seu julgamento), transita em julgado e a pena é executada. O regime (fechado, semiaberto, aberto ou domiciliar, se for o caso) será definido conforme a pena e as condições pessoais.

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