A região em que Catarina Kasten, de 31 anos, foi estuprada e assassinada em 21 de novembro deste ano, em Florianópolis, registrou 63 casos de violência contra mulheres. O recorte, com dados da Secretaria de Estado de Segurança Pública (SSP) obtidos com exclusividade pelo NSC Total, é de 1º de janeiro a 4 de dezembro, e inclui os bairros Armação, Armação do Pântano do Sul e Pântano do Sul, todos localizados ao Sul da Ilha.

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Catarina foi estuprada e assassinada após sair de casa para ir a uma aula de natação. Os crimes aconteceram na trilha da praia do Matadeiro, que fica ao Sul da capital catarinense, local bastante frequentado pelos moradores da região.

— O caso da Catarina foi um feminicídio não íntimo. Por isso que ele choca tanto, porque é um feminicídio que pode acontecer com qualquer uma de nós — comenta Tammy Fortunato, advogada e presidente da Comissão Nacional de Combate à Violência Doméstica da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

O levantamento, feito pela SSP, inclui os casos de violência de cinco tipos: ameaça, estupro, lesão corporal dolosa (grave ou gravíssima) e vias de fato. Ainda, os dados são referentes ao registro do Sistema Integrado de Segurança (SISP), que não específica o total de vítimas oriundos daquele caso.

De acordo com a Polícia Militar, o bairro em que a ocorrência é registrada, especialmente nessas áreas em que as divisas não são bem definidas, pode não ser fidedigno ao ponto exato do crime. Ou seja, pode ocorrer de uma situação ser registrada na Armação, por exemplo, mas ter ocorrido em um ponto mais conhecido, como Armação do Pântano do Sul.

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Sendo assim, os bairros Armação, Armação do Pântano do Sul e Pântano do Sul registraram juntos 63 casos de violência contra mulheres em 2025 — uma queda de 11% em relação ao ano passado, quando, no mesmo período, foram 71.

As informações mostram que, dos 63 casos, 33 foram no interior de ambientes, incluindo residências, comércios (local de alimentação, restaurante, mercado, shopping, agropecuária, barbearia, salão de beleza), veículos, instituições de ensino público ou privado.

Além disso, do total, 18 dos crimes ocorreram em vias públicas e 12 em ambientes virtuais, como redes sociais, e-mail e aplicativos de mensagens. O levantamento considerou o caso de Catarina, por exemplo, como estupro.

— Se a gente consegue mapear as regiões que mais precisam [de ações], vão ter políticas públicas, um policiamento específico para aquela região. Mas, para isso, a gente precisa de denúncia, a gente precisa conhecer a região — acrescenta a advogada.

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Casos registrados na Armação do Pântano do Sul – 26

  • Vía pública: 7
  • Ambiente virtual: 3
  • Dentro de ambiente: 16

Por classificação:

  • Ameaça: 21 (3 por meio virtual, 1 em comércio, 10 residências, 6 em vias públicas sem classificação e 1 em instituição de ensino);
  • Vias de fato: 2 (1 residência e 1 em outros ambientes);
  • Importunação Sexual: 1 (veículo);
  • Lesão corporal leve ou gravíssima: 2 (comércios).

Casos registrados na Armação – 8

  • Vía pública: 3
  • Ambiente virtual: 3
  • Dentro de ambiente: 2

Por classificação:

  • Ameaça: 8 (3 por meio virtual, 3 em vias públicas sem classificação, 1 em comércio e 1 em residência).

Casos registrados na Pântano do Sul – 29

  • Vía pública: 8
  • Ambiente virtual: 6
  • Dentro de ambiente: 15

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Por classificação:

  • Ameaça: 23 (2 em comércios, 6 por meio virtual, 9 residências e 6 em vias públicas sem classificação)
  • Vias de fato: 1 (residência);
  • Estupro: 1 (em via pública sem classificação) – o registro é referente a morte de Catarina;
  • Lesão corporal leve ou gravíssima: 4 (2 em comércios, 1 em via pública sem classificação e 1 em outros ambientes).

Caso Catarina traz novo debate sobre insegurança de mulheres

De acordo com a advogada Tammy Fortunato, o feminicídio íntimo é aquele cometido em contexto doméstico, familiar ou íntimo, de afeto, que pode ser previsível. No caso de Catarina, no entanto, não havia vínculo com o autor do crime.

— É um feminicídio que a gente não espera, que a gente não tem como prever que isso vai acontecer. São violências diferentes e precisam ser analisadas de modos diferentes — acrescenta.

Entretanto, a presidente da Comissão Nacional de Combate à Violência Doméstica destaca que os casos de violência contra mulheres precisam ser debatidos.

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— Ela estava caminhando para ir para uma aula de natação. Poderia estar indo para a padaria, para a academia ou simplesmente passear, dar uma volta. Cadê a nossa liberdade de ir e vir em segurança? Nós não temos — pondera Fortunato.

Segurança das mulheres

Poucos dias após a morte de Catarina, em 26 de novembro, a Prefeitura de Florianópolis foi questionada pela reportagem sobre as ações executadas para garantir a segurança das mulheres na cidade.

Em nota, afirmou que “a Guarda Municipal de Florianópolis realiza rondas regulares e ações preventivas em várias regiões da cidade para garantir a segurança da população”. (confira a nota na íntegra abaixo)

A Polícia Militar de Santa Catarina também foi questionada sobre o tema. A corporação destacou que “desenvolve, de forma contínua, ações voltadas à prevenção e ao enfrentamento da violência doméstica e familiar, atuando na proteção das mulheres por meio de programas estruturados, atendimento especializado e integração com a rede de apoio”. (confira a nota na íntegra)

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A advogada salienta que a segurança das mulheres deve ser garantida pelo governo federal, governo estadual e pelos municípios.

— O direito à segurança está previsto na própria Constituição da República, que todos nós temos direito à segurança, ou seja, ter uma vida segura — destaca Tammy.

O que diz a prefeitura

A Guarda Municipal de Florianópolis realiza rondas regulares e ações preventivas em várias regiões da cidade para garantir a segurança da população.

Além disso, a Prefeitura está investindo no videomonitoramento da capital, com totens que ajudam a coibir qualquer tipo de assédio ou violência, além de equipar as câmeras com tecnologia de reconhecimento facial, que vão auxiliar na busca e identificação de suspeitos.

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Situações de flagrante dependem de o agente estar no local no exato momento do ato criminoso. Por esse motivo, nem sempre é possível capturar os suspeitos flagrantemente, portanto, a GMF reforça a importância de denunciar o crime, acionar as forças de segurança e registrar a ocorrência na Delegacia de Polícia.

Vítimas de assédio e outros crimes sexuais podem, ainda, buscar amparo no Espaço Acolher, no Multihospital, que reúne diferentes serviços de saúde e segurança pública para evitar o deslocamento e a revitimização dessas pessoas.”

O que diz a Polícia Militar

A Polícia Militar de Santa Catarina (PMSC) desenvolve, de forma contínua, ações voltadas à prevenção e ao enfrentamento da violência doméstica e familiar, atuando na proteção das mulheres por meio de programas estruturados, atendimento especializado e integração com a rede de apoio.

Dentre as principais iniciativas, está o Programa Rede Catarina de Proteção à Mulher, que atua em todos os 295 municípios catarinenses. Somente em 2025, por meio da Patrulha Maria da Penha, o Programa já realizou 22.279 atendimentos, totalizando mais de 183 mil mulheres atendidas desde sua implantação, em 2017.

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A Rede Catarina é destinada ao acompanhamento de mulheres vítimas de violência doméstica e familiar que possuem medidas protetivas de urgência deferidas pelo Poder Judiciário.

O trabalho é desenvolvido por meio de visitas preventivas às residências das vítimas, para fiscalização do cumprimento da medida orientações, encaminhamentos à rede assistencial e, principalmente, pelo uso do Botão do Pânico, disponível no aplicativo PMSC Cidadão.

O Botão do Pânico é exclusivo para mulheres com medida protetiva de urgência vigente. Em caso de violação da medida, o acionamento do recurso permite, por meio de georreferenciamento, que a guarnição policial mais próxima seja deslocada de forma imediata e prioritária para o atendimento da ocorrência. Atualmente, o Estado conta com 16.709 mulheres com o botão do pânico ativo em seus celulares.

De forma preventiva, a PMSC também desenvolve a ação “Protetores do Lar”, que consiste em palestras direcionadas a estudantes do 2º ano do Ensino Médio, abordando temas como a Rede Catarina, aspectos psicológicos e jurídicos da violência doméstica.

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O objetivo é conscientizar os jovens para que saibam identificar situações de violência, auxiliar familiares e pessoas do convívio social e reconhecer relacionamentos abusivos, contribuindo para a quebra do ciclo da violência.

Além disso, são realizadas diversas operações e campanhas educativas no decorrer do ano, bem como capacitação e atualização de policiais que trabalham com a temática.

A Polícia Militar de Santa Catarina mantém suas ações pautadas na prevenção, no atendimento qualificado e na pronta resposta às ocorrências, fortalecendo diariamente as estratégias de proteção às mulheres e o enfrentamento à violência doméstica e familiar em todo o Estado.

Morte de Catarina completa 1 mês

A morte de Catarina Kasten completa 1 mês neste domingo (21). A vítima do crime bárbaro era estudante da pós-graduação de Estudos Linguísticos e Literários da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e professora de inglês.

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Ela vivia na Praia da Armação com o marido, Roger Gusmão. Os dois planejavam construir uma casa na Praia dos Açores em janeiro do próximo ano. Entretanto, os planos foram interrompidos com o assassinato, que ocorreu nas proximidades da trilha da Praia do Matadeiro, em uma sexta-feira, quando Catarina ia para uma aula de natação na Praia da Armação.

Ao perceber a demora da esposa em retornar para casa, o companheiro acionou a Polícia Militar, por volta das 12h, após confirmar que ela não tinha comparecido à aula.

Um homem de 21 anos foi identificado como autor do crime com a ajuda de câmeras de segurança e de fotografias feitas por turistas minutos antes do assassinato. Ele foi preso no mesmo dia, em casa, e confessou ter matado a estudante.

Assassino armou emboscada para Catarina

De acordo com a denúncia apresentada à Justiça em 1º de dezembro, o crime foi cometido mediante emboscada, pois o denunciado se escondeu atrás de uma lixeira para monitorar a movimentação no local, como registraram imagens de câmeras de segurança da comunidade.

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Quando Catarina passou pela trilha, por volta das 7h, o acusado teria aplicado um golpe de imobilização conhecido como “mata-leão”, de acordo com o Ministério Público de Santa Catarina (MPSC).

Em seguida, arrastou a vítima para um ponto isolado da mata, onde teria cometido o crime de estupro e matado a vítima por estrangulamento usando um cordão/cadarço.

Após o assassinato, o corpo de Catarina foi arrastado para uma área de difícil acesso, entre pedras e vegetação, longe da trilha principal, para dificultar a localização.

O homem deverá responder por feminicídio, crime praticado por menosprezo à condição de mulher, com três qualificadoras: morte por asfixia, uso de recurso que dificultou a defesa da vítima e ação para assegurar a ocultação do cadáver.

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