Santa Catarina vive um “boom” no processo migratório. Dados do Censo 2022, divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE), mostram que o Estado foi a unidade da federação com o maior saldo migratório no Brasil. Entre 2017 e 2022, 503.580 pessoas chegaram à região, enquanto apenas 149.230 saíram, o que representa um saldo de 354.350. 

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E isso também impacta diretamente na política. Ao menos 609.206 eleitores de outros estados e também do exterior realizaram a transferência do domicílio eleitoral para Santa Catarina entre 2015 e 2025, conforme dados do TRE. Conforme Carlos Valério Gerber Wietzikoski, coordenador de Gestão do Cadastro Eleitoral do TRE-SC, esse é um dos principais motivos que fizeram o eleitorado catarinense crescer nos últimos anos. 

— Santa Catarina poderá receber para as eleições de 2026 mais de 1,1 milhão de novos eleitores, considerando todos aqueles que passaram a residir no Estado de Santa Catarina, principalmente na região do Litoral Norte de Santa Catarina, onde tem se observado o maior maior fluxo de transferência. Temos casos de municípios como Palhoça, na Grande Florianópolis, em que pode atingir quase 60 mil novos eleitores, o que representa um acréscimo de quase 40% do eleitorado atual, caso todas as pessoas que lá residam decidam transferir para lá — explica. 

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A maioria dos novos eleitores é do Sul do país. A liderança é em relação aos gaúchos, onde 170.401 dos eleitores do Rio Grande do Sul pediram a transferência para Santa Catarina, como no caso da aposentada Luisa Amélia Podlasinski Martins. Natural de Porto Alegre, ela se mudou para Florianópolis em 2018, mas só em julho deste ano resolveu mudar o local de votação. 

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— Decidi [mudar] faz pouco tempo. Já era para ter sido transferido da última eleição, mas quando eu procurei, já tinha passado o prazo e aí ficou para essa próxima — diz. 

Atualmente com 61 anos, Luisa vota desde os 18 e vê que a prática é importante principalmente para ter a garantia de seus direitos como cidadã: 

— Eu acredito que tendo participação do voto, tu consegue adquirir outras coisas, conhecimentos e cobrar mais dos políticos, tanto do governo, do deputado, da Assembleia. Tu consegue fazer cobranças em cima disso.

Mas não são apenas os estados do Sul que predominam no perfil dos novos eleitores catarinenses. Um exemplo disso é que no top 5 das transferências, Pará (no Norte) e a Bahia (no Nordeste) também estão entre as unidades onde um grande número de eleitores passou a votar em Santa Catarina na última década: 43.230 e 23.035, respectivamente. E isso, conforme o cientista político e diretor da Quaest, Felipe Nunes, também pode trazer reflexos na hora do voto. 

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— A influência dessa migração interna, principalmente vinda do Nordeste, do Norte, gera, obviamente, um padrão diferente de votação. Caso esse eleitor mantenha seus valores e tradições de onde ele vem para tentar influenciar o local, por outro, ele gera uma reação também conservadora, bastante relevante. Essa pergunta política dos estados do Centro-Oeste, em especial Santa Catarina, como é que vai se dar a incorporação desses migrantes, se vai ser por meio de um conflito, de uma disputa de visões e valores ou se vai haver uma acomodação que acaba fazendo com que esses imigrantes tentem absorver valores e costumes típicos da região e acabem, com isso, mudando suas percepções de mundo e suas atitudes — fala. 

O prazo para que o eleitor faça a transferência do título termina em 6 de maio de 2026. A solicitação pode ser feita tanto de maneira online, quanto nos cartórios eleitorais. A orientação do TRE é de que o eleitor faça a mudança o quanto antes, para evitar transtornos. 

— Os cartórios já estão abertos e promovendo transferências e alistamento, mas a demanda tem sido muito menor do que aquela que nós vemos no fechamento do cadastro. Orientamos que todas as pessoas que residem em Santa Catarina e que ainda não tem título ou que já tem e pretendem transferir procurem o atendimento o mais cedo possível — enfatiza Carlos Valério Gerber Wietzikoski, do TRE-SC.

SC recebeu mais de 600 mil novos eleitores nos últimos 10 anos em meio a boom migratório
Naissara Tano, de 16 anos, irá votar pela primeira vez em 2026 (Foto: Gabriel Marques, NSC TV Chapecó)

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O impacto do eleitor jovem na decisão política 

A estudante Naissara Tano, de 16 anos, irá votar pela primeira vez em 2026. Moradora da Reserva Indígena Xapecó, em Ipuaçu, no Oeste do Estado, ela enxerga o voto como uma oportunidade de trazer visibilidade para a comunidade onde vive: 

— Como jovens, nós temos a nossa voz e podemos também decidir o futuro do nosso país, da nossa aldeia. Às vezes as pessoas falam “o voto não vai mudar de nada”, mas a gente sabe que ali estamos escolhendo pela gente.

A adolescente faz parte dos 1.095.934 jovens entre 16 e 29 anos que poderão votar nas próximas eleições em Santa Catarina, conforme dados do TRE-SC até agosto deste ano. O número representa 19,87% do eleitorado catarinense. 

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No Brasil, o voto é obrigatório a partir dos 18 anos, no entanto, o cidadão já pode tirar o título aos 16, tornando o voto facultativo até atingir a maioridade. Nas últimas eleições gerais, 34.305 adolescentes entre 16 e 17 estavam aptos a votar, um número que, a cada pleito, é incentivado pelo próprio TRE para que cresça. 

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— Está em curso o “Justiça Eleitoral em Movimento”, que é um atendimento em que o cartório se desloca para localidades ou bairros distantes para atendimento. Essas situações têm estimulado o atendimento inclusive em escolas, para que os maiores de 15 anos possam já ser atendidos e ter o seu título — pontua Carlos Valério Gerber Wietzikoski, do TRE-SC. 

É o que aconteceu na Escola de Educação Básica Presidente Médici, em Joinville, no Norte do Estado, onde os alunos se sentiram motivados a fazer o título de eleitor após uma palestra que ocorreu no local. 

— Eu acho bem importante porque cada voto conta, e aí eu vou estar mais ciente e por dentro da política. Por mais que no começo eu não gostava tanto e sinceramente, eu não queria estar por dentro disso, eu vejo que a política está em tudo ao nosso redor, então é necessário a gente estar por dentro e saber de cada coisa — enfatiza o estudante Richard Morara de Oliveira da Silva, de 16 anos. 

E não é preciso participar de uma eleição para se ter uma noção da importância da democracia. Na escolha de um Grêmio Estudantil, por exemplo, os alunos também são instigados a definirem seus representantes por meio do debate plural de ideias. É como explica a professora Rúvia Rafaelle Pimentel Pereira, que coordenou a escolha do Grêmio em uma escola municipal de Criciúma, no Sul do Estado:

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— A cidadania é algo que vejo que a gente incute neles na escola. Então, a partir do momento em que os alunos estão entendendo a importância de um voto e da eleição, dentro da escola, que é o local onde eles mais tem convívio, eles entendem que a partir do voto a gente consegue criar cidadãos mais críticos.

O mestre em Sociologia Política e professor da Univali, Roberto Wöhlke, complementa, ainda, que presença do jovem dentro do processo eleitoral vai muito além da participação na escolha, mas também na renovação das bancadas: 

— Com o jovem sempre há a possibilidade da mudança da política. E a cada ano vem crescendo mais o número de jovens que queiram participar do processo. Isso é louvável, inclusive para democracia. A ideia que está cada vez mais de que esses jovens tenham consciência. E eu acredito que sim, uma ideia de renovação da política, porque temos acesso à informação cada vez mais fácil. Temos jovens cada vez mais conectados a essa realidade política e temos uma necessidade, talvez, de mudança nesse jovem. Traz mudanças da qual ele acredita que a política possa sim, se transformar e mudar. 

A democracia e o eleitorado 

Em 2026, jovens, mulheres, migrantes e indígenas, independente do perfil, irão às urnas com um único objetivo: definir os seus representantes para os próximos quatro anos — ou oito no caso da escolha para o Senado. E é por meio deste voto que eles irão definir não só seus representantes, mas também vão ter o espaço de mostrar como pensam dentro do sistema democrático. 

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— O voto é a pedra angular da democracia, ou seja, é através dele que nós, enquanto povo, exercemos o nosso direito de exercer nossa cidadania política. É através do voto que nós autorizamos que pessoas representantes tomem decisões em nosso nome. Vão estar tomando decisões que vão afetar o nosso dia em termos de saúde, educação, economia, emprego — enfatiza o professor de Sociologia e Ciência Política da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Julian Borba. 

No entanto, o descrédito com a política tem afastado cada vez mais o eleitor das urnas. Segundo dados do TSE, a abstenção em SC foi de 16,40% no primeiro turno das eleições gerais em 2014, com a ausência de 796.918 pessoas. Já em 2022, esse número foi para 18,45%, com 1.012.860 catarinenses deixando de ir aos locais de votação. 

— Nos últimos tempos, a gente tem sofrido uma espécie de descrédito da política. As pessoas, quanto menos se veem representadas, também menos querem participar. Na visão da população brasileira e na história do Brasil, a noção de cidadania tem muito mais a ver com acesso a direitos sociais do que necessariamente com o voto direto. Então, esse é um elemento para a gente pensar — comenta Glaúcia Fraccaro, professora do Departamento de História da UFSC. 

Por isso, é importante reforçar o quanto o voto é significativo para garantir a representatividade dos eleitores não só nos dados estatísticos, mas também nos centros onde há o poder de decisão. 

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— É muito importante que todas as pessoas participem do processo eleitoral, na escolha dos candidatos. Quanto mais pessoas participarem, maior será a legitimação e a representatividade de quem é eleito. É importante a pessoa também saber que a urna é segura, o voto é secreto. Você pode escolher livremente. A pessoa pode votar em quem ela quiser, dentro da sua escolha, na sua vontade — finaliza Carlos Valério Gerber Wietzikoski, do TRE-SC.

Radiografia do eleitorado de SC

A série de reportagens “Radiografia do eleitorado de Santa Catarina” é uma parceria entre o NSC Total e a NSC TV. Divido em três matérias, o especial mergulhou, com o apoio de dados, nos detalhes do eleitorado de Santa Catarina, suas características e o peso que o eleitor tem nas escolhas para cargos públicos, já mirando as eleições de 2026.

FICHA TÉCNICA

  • Reportagem: Luana Amorim 
  • Produção: Elaine Simiano, Rafaela Cardoso, Mateus Barreto, Simone Philipsen, Claúdia Pletsch, João de Carvalho, Reginaldo de Castro e Luís Casagrande
  • Imagens: Patrick Rodrigues, Alessandro Carrer, Josué Betim, Matheus Castro, Gabriel Marques, Heverton Ferri e Lucas Mendes 
  • Infográficos: Ben Ami Scopinho 
  • Edição: Augusto Ittner e Léo Laps 
  • Coordenação: Raquel Vieira

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