Em Paris, o suíço René Robert sai para caminhar pelo bairro onde mora. É janeiro, faz muito frio à noite. Ele escorrega, cai, agoniza oito horas no chão da capital francesa. Ninguém o socorre. A exceção é um sem-teto que chama os serviços de emergência. É tarde. O fotógrafo de 85 anos morre de hipotermia.
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No Rio de Janeiro, o congolês Moise Mugenyi vai ao quiosque onde trabalha cobrar diárias atrasadas. É janeiro, faz muito calor na Barra da Tijuca. O gerente da birosca se revolta. Chama quatro companheiros para agredir, com pedaços de pau e tacos de beisebol, o africano. Tudo flagrado por câmeras de segurança. O jovem de 24 anos morre sob o sol.
Em meu perfil no LinkedIn, escrevi que acredito na ciência e na ética e mantenho um fiapo de esperança na viabilidade do ser humano. Chegou a hora de mudar parte desta frase. Essas duas mortes mostram que vivemos tempos de selvageria, barbárie, insensibilidade. Tempos de estupidez, ignorância, obscurantismo. Tempos de boçalidade, brutalidade, justiçamentos. Tempos de horror.
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“O que a gente vem testemunhando é o triste fim da nossa sociedade e da nossa capacidade de indignação contra esses tipos de violência”, diz a esta coluna Alexandre dos Santos, jornalista e professor de Relações Internacionais da PUC-Rio.
Estamos paralisados, adormecidos, mergulhados no que chamam de “normalpatia” – a aceitação dos absurdos, preconceitos, violência, assassinatos. Mais um velho largado ao relento? Mais um negro espancado? Quem se importa, deixem morrer. A quem interessa o passado, o presente, o futuro, a história de cada um deles?
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O primeiro, um famoso fotógrafo da dança flamenca. O outro, fugitivo da violência do Congo, refugiado político no Brasil. René e Moise são vítimas da desumanização. René e Moise são provas de que falimos como sociedade. René e Moise mostram que o ser humano é um projeto fracassado.
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