
Infraestrutura
O que têm em comum um gaúcho desaparecido em um rio, motoristas conduzidos a um local de difícil acesso pelo GPS, agricultores que precisam contornar dezenas de quilômetros entre lavouras vizinhas e uma ponte pênsil que caiu há quase 40 anos? Esses fatos ilustram as dificuldades enfrentadas para deslocamentos em vários pontos da divisa entre Santa Catarina e Rio Grande do Sul.
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Na noite do último sábado (9), Cristiano de Oliveira Pedrosa, 33 anos, viajava de Caxias do Sul, sua cidade natal, em direção a São Joaquim. Ao chegar na divisa dos estados, por uma estrada vicinal do município de Bom Jesus, deparou-se com o Rio Pelotas na chamada ponte da Volta da Couve. A atravessando, estaria em Santa Catarina, na localidade de São João do Pelotas.
Ocorre que essa é uma das várias chamadas "pontes molhadas", comuns na região. Ou seja, subiu a maré, a ponte fica encoberta. Mas Cristiano confiou na potência da caminhonete que dirigia. Ele não contava com a lâmina de 75 centímetros e a força do rio, que arrastou o carro. Cristiano e a mulher que o acompanhava, de 23 anos, conseguiram subir no carro. Ela nadou até a margem no lado gaúcho e sobreviveu. Ele sumiu na água.
O pedido de socorro só chegou ao Corpo de Bombeiros na manhã de domingo (10). Unidades de São Joaquim e da cidade gaúcha de Vacaria deslocaram-se. As buscas alcançaram o terceiro dia nesta terça-feira (12) e ainda não há notícias sobre o paradeiro de Cristiano. Seis bombeiros têm feito a varredura. Nesta terça, eles estiveram a 2 quilômetros correnteza abaixo do ponto onde ele desapareceu. Nenhum sinal.
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Seguindo 30 quilômetros pelo Rio Pelotas, correnteza abaixo, alcança-se outra ponte, a das Goiabeiras. Essa é um amontoado de tábuas e vigas precárias que, a muito custo, conseguem suportar carros de passeio, caminhões e até ônibus que fazem o trajeto entre São Joaquim e Bom Jesus pela SC-114, no lado catarinense, e RS-110, no lado gaúcho.
Fora as vezes em que encontra-se encoberta pela força da água do Rio Pelotas, a ponte das Goiabeiras sofre desfalques corriqueiros, quando a cheia leva as tábuas e deixa a estrutura descoberta, ainda mais arriscada para os corajosos que ousam fazer uso desse caminho. Mas geralmente quem ali chega não está ciente da dificuldade.
- Acontece que, para quem está em São Joaquim e aciona o GPS para ir ao Rio Grande do Sul, é levado automaticamente a essa ponte pelo equipamento - conta o empresário Jaziel Pereira, um combativo ativista não somente pela construção de uma ponte nova, em condições no local, como também pela efetivação da projetada BR-438, o sonhado Caminho das Neves, que é pleiteado junto ao Governo Federal e compreenderá, futuramente, toda essa extensão oferecendo uma nova rota turística.
- Precisamos que sejam feitas pontes de concreto e altas, tanto no lugar dessa ponte das Goiabeiras, quanto lá na Volta da Couve - observa Jaziel, citando o local onde ocorreu o acidente do último sábado.
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Há pouco mais de um mês, em um ato em Lages, o governador Carlos Moisés anunciou a construção da ponte das Goiabeiras. - Vamos repassar a primeira parcela do recurso até novembro - disse, na ocasião. Serão investidos R$ 12,4 milhões para construir a ponte de 160 metros que ligará os dois estados. - O que tem ali, hoje, é uma ponte precária - confirma o prefeito Giovani Nunes, de São Joaquim. Enquanto isso, a comunidade se une no conserto quando a situação piora.
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Uma ponte pênsil une as comunidades de Vila Santa Catarina, em São João do Sul, e Glória, em Torres. Nesse ponto, é o Rio Mampituba que separa catarinenses e gaúchos. - É uma região muito forte na agricultura, muitas lavouras de arroz, tem cooperativa importante ali - refere o prefeito Moacir Teixeira. Do lado catarinense, a pequena cidade de 7,3 mil habitantes sonha há décadas com a chamada ponte do Rio Verde.
Finalmente ela começou a sair do papel. Em 2014, os então prefeitos das duas cidades iniciaram uma força-tarefa, fizeram projeto e foram a Brasília. Conseguiram R$ 1,2 milhão. Houve entraves. A ordem de serviço foi entregue em 2016, com previsão de conclusão da obra em 2018. Acabou ganhando fôlego de fato no ano seguinte e agora teve um passo importante. No último sábado (9) as vigas de 30 metros de altura começaram a ser implantadas no rio. Cada uma pesa 44 toneladas. É sobre elas que será feito o leito da pista que unirá os dois lados do rio. O investimento chega a R$ 1,8 milhão, R$ 600 mil da prefeitura de São João do Sul e o resto da União.
- Com essa ponte, a distância percorrida por produtores rurais de um lado para outro vai diminuir 40 quilômetros - destaca o prefeito Moacir. - Muitas vezes são agricultores que têm propriedades dos dois lados e precisam fazer esse trânsito todo com máquinas, caminhões e produtos. Essa ponte vai ser decisiva para escoar uma safra superior a 1,5 milhão de sacas de arroz entre a nossa cidade e Torres - detalha. A meta é inaugurar a ponte até março de 2022.
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Passo de Torres, no extremo Sul catarinense, e Torres, no litoral norte gaúcho, são unidas pela ponte da BR-101 e, em 2007, ganharam um novo acesso. Mas há um caso folclórico envolvendo passagem de pedestres entre as cidades, que só não são conurbadas pois há, entre elas, o Rio Mampituba.
Nos anos 60, uma ponte pênsil foi estendida. Na época, Passo de Torres era distrito de São João do Sul. E continuava nessa condição em dezembro de 1984, quando os prefeitos das duas cidades reformaram a antiga ponte, que só comportava 3 pessoas e era baixa, via de regra o rio a molhava.
A nova ponte poderia receber até 15 pedestres simultaneamente. Eis que o ato de inauguração por pouco não acabou em tragédia. Comitivas dos dois lados subiram solenemente e após curta caminhada, o objetivo era um encontro festivo dos prefeitos no meio do caminho, na divisa dos estados, para celebrar a conquista. Eis que a ponte pênsil veio abaixo, levando para a água mais de 40 pessoas. Nem o padre escalado para a cerimônia escapou. Uma rápida ação de resgate permitiu que não houvessem feridos muito menos mortos. Mas foi um susto danado.
Apurou-se, após o acidente, que o excesso de pessoas causou o rompimento de uma peça da ponte pênsil, que não resistiu. Meses depois, uma nova foi instalada e entregue sem pompas ao uso. Vez por outra, as prefeituras realizam manutenção e ela ali está, servindo aos pedestres catarinenses e gaúchos.
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