Quando a Kraft Heinz anunciou a compra da Hemmer, em setembro de 2021, o presidente da operação brasileira da empresa, Fernando Rosa, veio até a fábrica de Blumenau para dar um recado. A um auditório tomado por funcionários, o executivo disse que a centenária marca de conservas e molhos estava ganhando o mundo ao se juntar a um grupo multinacional que já tem Heinz e Quero no portfólio.
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Dois anos, ajustes de rota e alguns percalços depois – entre eles adaptações na produção que chegaram a comprometer o abastecimento de alguns produtos da linha –, os novos donos dizem ter planos ambiciosos para a Hemmer, que incluem levar a marca para novos mercados no Brasil e até mesmo para o exterior. Novos investimentos no parque fabril de Blumenau, onde trabalham 800 pessoas e são fabricados cerca de 200 itens, também estão no radar.
Hemmer reabre loja de fábrica em Blumenau após 7 meses
Em entrevista exclusiva concedida à coluna no último dia 18, Rosa revelou bastidores da negociação e compromissos assumidos com a família que até então administrava o negócio, falou da admiração pessoal que já tinha da marca blumenauense, explicou detalhes da transição do negócio e reiterou que a Hemmer está no centro da estratégia de crescimento da Kraft Heinz no país.
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Já são quase dois anos desde a aquisição da Hemmer pela Kraft Heinz. O que pesou na compra?
A Kraft Heinz já tem há três, quatro anos um plano muito ambicioso de crescimento no Brasil. A gente entende que é o principal mercado emergente do mundo, com potencial enorme e uma alavanca importante para a companhia. Estamos fazendo isso de duas formas. Uma com crescimento orgânico, expandindo a distribuição. A outra maneira que a gente encontrou, de forma inorgânica, foi através da aquisição da Hemmer, que era até então o nosso grande concorrente regional. Sou presidente (da empresa) há três anos, mas antes fui dois anos o responsável pela área comercial. Vivi na pele essa concorrência que as empresas tinham. Eu particularmente sempre fui muito admirador da Hemmer. A marca tem um poder e um carinho muito grandes no Sul em geral, mas principalmente em Santa Catarina.
A partir do momento em que a gente resolveu crescer no Brasil através de uma aquisição, a Hemmer sempre foi o nosso sonho, porque colocaríamos para dentro do negócio uma marca incrível, que assim como a Heinz tem qualidade como algo indiscutível.
Vimos muita coisa em comum. Foi um ano e meio de conversas com a família. São pessoas que eu tenho um carinho muito grande e que foram muito corretas com a gente.
Quer dizer que antes da aquisição a Hemmer te “incomodava” como concorrente?
Com certeza (risos). Era um concorrente superimportante no nosso negócio, principalmente em catchup, maionese, mostarda e condimentos no Sul do Brasil. Era uma disputa interessante pelo mercado, que fez a gente admirar a Hemmer.
Uma operação desse porte exige muitas análises de mercado e das demonstrações contábeis e financeiras, de estrutura. Em que pé a Kraft Heinz encontrou a Hemmer?
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Exatamente da forma que a gente esperava e que foi tratada desde o início com a família. Como eu comentei, eles sempre agiram de maneira muito correta com a gente. Quando fizemos a proposta de compra, nos baseamos em um business case de aquisição. Desde que gente concluiu o negócio e entrou na empresa, nesses dois anos, o nosso plano está seguindo exatamente o que a gente esperava, de forma transparente para a família do ponto de vista financeiro, de compliance, segurança, de qualidade. Está em linha com o que a gente tinha planejado antes de decidir fazer o investimento.
A família ainda tem algum tipo de voz na companhia?
Não mais. No começo do negócio eu fiz questão de deixá-los por perto. O Christian (Luef), que era o CEO anterior, e o Lisandro (Nunes da Rosa), que tocava a área comercial, a gente conversou muito durante um período. Mas logo depois que concluímos o negócio (em abril de 2022) eles optaram por seguir com os negócios deles e hoje não têm mais nenhuma relação profissional com a Hemmer.
A Hemmer é uma empresa com mais de 100 anos, tradicional e de gestão até então familiar. Como foi essa transição para um grupo multinacional?
Teve bastante desafio, pelo simples fato de a gestão, o dia a dia e o controle de uma empresa multinacional de capital aberto nos Estados Unidos demandarem muito da gente para manter a operação aqui no Brasil.
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Nosso grande desafio foi, da forma mais rápida que a gente pode, colocar a Hemmer dentro dos protocolos e processos da Heinz do ponto de vista multinacional, dado que era uma empresa que tinha seus negócios feitos dentro do ambiente nacional.
Qual a estratégia do grupo para a marca neste momento e também olhando para os próximos anos?
A Hemmer, hoje, é a nossa menina dos olhos. Ela está no centro da estratégia da companhia. Em 100 anos, a marca nunca fez investimentos grandes em marketing. A partir deste ano estamos fazendo, para levar a marca para todo o Brasil, não só para o Sul e Sudeste.
Quando a gente fez a aquisição eu falei em um auditório para os funcionários que naquele momento a Heinz ganhava Blumenau e a Hemmer ganhava o mundo. É o que a gente quer fazer, levar a Hemmer em um primeiro momento para todo o Brasil, mas sem dúvida em algum momento também para fora.
A marca preenche um espaço muito interessante no nosso portfólio. Os produtos Heinz são muito premium. A Quero é a nossa marca de valor, que fala com a dona de casa e muito com o momento de cozinhar. E a Hemmer é exatamente a marca que joga em um patamar de valor que interessa a milhões de consumidores no Brasil, espaço esse que a gente não jogava antes. Encaixou como uma luva na estratégia.
Esse perfil mais conservador de marketing é bem característico das empresas familiares. O que está sendo feito, dentro dessa estratégia, para tornar a marca Hemmer mais conhecida em outras regiões do Brasil?
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A ideia desde o início é aproveitar a nossa força para levar a Hemmer para outros estados. De São Paulo para cima principalmente, onde a marca nunca teve tanta musculatura de distribuição para chegar. Essa é uma fortaleza nossa como Kraft Heinz. E sempre explorando muito a credibilidade de uma marca centenária nacional, porque não é fácil sobreviver 100 anos crescendo no Brasil, e fazendo questão nas campanhas de destacar muito a qualidade dos produtos. Isso é algo indiscutível e inegociável na Hemmer, assim como na Heinz. Temos destacado esses dois fatores. Os planos para o ano que vem estão ainda mais agressivos. A gente quer investir ainda mais e seguir contando essa história para todo o Brasil.
O que você já pode adiantar desse plano mais agressivo?
Eu não posso contar nada ainda. Estamos preparando o terreno. Mas o que eu posso garantir é que virão boas novidades. O pessoal do Sul, que cresceu com a Hemmer, vai ficar bastante orgulhoso de ver a marca ganhando o Brasil.
Há muitos relatos de consumidores de que ficou difícil encontrar alguns produtos da Hemmer em supermercados, como a mostarda escura, e que outros saíram de linha. Houve de fato readequação do portfólio desde a aquisição?
Não houve nenhuma readequação do portfólio como um todo. O que houve foi um período de adaptação da fábrica de Blumenau aos controles de gestão da Kraft Heinz global. A gente tem um direcional protocolar para a fábrica operar. E quando eu falo fábrica, não é a fábrica por si só, mas também os fornecedores que levam as matérias-primas. Por exemplo, sobre mostarda e pepino, a gente está falando com os fazendeiros, as pessoas que plantam.
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Tem um protocolo muito rigoroso, até para garantir esse compromisso com a qualidade que a Heinz tem no mundo, que a gente teve que colocar rapidamente em curso na Hemmer. Infelizmente a consequência disso no primeiro semestre foi, de fato, a falta de produtos em algumas categorias importantes. A mostarda escura foi um exemplo.
Mas em julho tivemos um mês incrível de produção em Blumenau, estamos superfelizes com a evolução da fábrica. Com certeza no segundo semestre a gente vai voltar a ter os principais produtos da Hemmer nas gôndolas do Sul e do resto do Brasil.
Então a fábrica de Blumenau está dentro dos padrões que a Kraft Heinz entende de produção? Não vai mais ter problema com falta de pepino e mostarda escura?
Está 100%. Não vai ter mais. É o nosso compromisso. Em julho já tivemos um mês muito bom e agora é só continuar. Vamos voltar a atender os consumidores que, com razão, estão sentindo falta desses produtos.
Em Blumenau, a venda de uma empresa regional para uma multinacional costuma gerar desconfiança. Há receio de que a marca vai perder vínculo com a cidade, de que ela vai desaparecer do mercado, que os produtos perderão qualidade ou, neste caso, mudar de sabor. O que você diria a quem tem este tipo de preocupação?
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O que eu sempre tenho dito desde que a gente fez a aquisição. O blumenauense pode ficar 100% tranquilo que o nosso compromisso, inclusive com a família no começo das conversas, é de que a gente em momento algum faria qualquer alteração em qualquer formulação de produtos da Hemmer. Temos muito orgulho da qualidade e do sabor dos produtos Hemmer e do que isso significa para o povo de Blumenau.
Eu entendo (a desconfiança) porque há histórias de aquisições recentes em outras categorias de empresas, que tomaram a decisão de cortar portfólio e até de sair da região. Tudo isso me foi relatado, eu aprendi nessas minhas idas a Blumenau. Mas, no nosso lado, é o contrário.
Vamos seguir apostando na qualidade dos produtos e na conexão com a cidade também. Temos muito orgulho de empregar todas as pessoas que a gente emprega e representar tudo o que a gente representa para a renda na cidade, na fábrica e nos arredores.
Quando houve a compra da Hemmer, especulou-se que a Heinz poderia fazer novos investimentos para ampliar a produção da fábrica de Blumenau. Isso está no radar?
Está no radar. A gente tem a intenção de fazer investimentos e ampliar a produção na fábrica de Blumenau. Estamos conversando internamente e com as autoridades da cidade e do Estado. A nossa intenção é fortalecer a capacidade de produção dos produtos da Hemmer em Blumenau.
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Essa intenção é de ampliação de área física ou incluir novos produtos nas linhas?
Tem de tudo. A gente quer levar inovação para Blumenau, ter mais linhas de produtos lá, mais espaço de armazenamento para poder ter um nível de serviço bom para os clientes. Temos um plano bem ambicioso. Agora, com a fábrica assumindo 100% dos protocolos da Heinz, é pensar como a gente continua crescendo o nosso negócio na região.
Esse plano é para já ou para médio e longo prazos?
É médio prazo. É algo para logo, não é tão longo, não. Estamos nos estruturando.
Você comentou da estratégia de levar a Hemmer para outros estados do Brasil, pegando carona na infraestutura logística do grupo Kraft Heinz. Exportar a marca está nos planos?
Sem dúvida. A gente já tinha operação da Hemmer em alguns países da América do Sul. Mas a gente acredita que isso pode ser muito maior. Está no nosso radar, a partir do ano que vem, levar a Hemmer para outros países dentro da América Latina.
Hoje a operação de Blumenau produz apenas a marca Hemmer ou há produtos de outras marcas do grupo sendo feitos também?
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Por enquanto, só produtos da marca Hemmer.
Existe a intenção de fabricar produtos Heinz também?
Sim, existe a intenção de produzir Heinz e Quero em Blumenau. Já estamos produzindo Hemmer em Goiás. Fizemos um lançamento superimportante, o molho de tomate Hemmer, que é produzido nas linhas de molho de tomate que ficam lá. Blumenau não tem essa linha. Estamos aproveitando uma linha que faz Heinz e Quero, e que agora também faz o molho de tomate Hemmer.
O que mais dá para esperar da marca Hemmer dentro do planejamento estratégico da Kraft Heinz?
Segunda-feira (21) vai ser um marco importante para a cidade (a entrevista com o executivo foi feita no dia 18 de agosto, antes da reabertura do Empório Hemmer aos funcionários, no dia 21). Estamos com alta expectativa para abrir a nossa nova loja, o novo empório da Hemmer. E uma curiosidade: é a primeira loja da Kraft Heinz no Brasil. Não temos esse modelo em nenhum lugar e estamos animados em testá-lo.
O que a cidade pode esperar é um foco total da Kraft Heinz em seguir desenvolvendo a Hemmer, levando a marca para o consumidor, não só para o Sul, mas em outros estados do Brasil, com inovação e comunicação, e sempre reforçando os mais de 100 anos da história e a qualidade indiscutível dos produtos.
Essa loja de fábrica pode ser um modelo de negócio novo para a companhia?
A gente não tem isso no plano, mas estou aberto e gosto do modelo. Vamos entender e pode, sim, ser alguma coisa que a gente possa querer fazer para frente. Mas não é a nossa prioridade. A prioridade era encontrar uma forma de reabrir a loja tão esperada pelo consumidor de Blumenau e fazer esse modelo acontecer. Estamos 100% dedicados a isso agora. Lá na frente, se caminhar bem, a gente quem sabe pode pensar em ter um novo canal surgindo.
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