Em interrogatório ao Supremo Tribunal Federal (STF) nesta terça-feira (10), Jair Bolsonaro negou qualquer tentativa de golpe, pediu desculpas por acusações contra ministros do Supremo e justificou suas ações como dentro da legalidade. O ex-presidente é apontado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) como o líder da trama que pretendia impedir a posse de Lula.
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Negação de golpe e defesa da “minuta constitucional”
Bolsonaro afirmou que nunca houve intenção de golpe, classificando a discussão sobre a minuta encontrada como “dentro da Constituição”. Disse que o documento foi exibido brevemente em uma reunião e descartado.
O ex-presidente reconheceu que houve encontros com integrantes das Forças Armadas após o resultado da eleição, mas alegou que não tratavam de golpe, e sim de hipóteses dentro das regras do jogo democrático.
— As conversas eram bastante informais. Não era nada proposto aqui, vamos decidir. Era conversa informal para ver se existia alguma hipótese de um dispositivo constitucional para a gente atingir o objetivo que não foi atingido no TSE. Isso foi descartado na segunda reunião. (…) Tratamos de GLO, dos caminhoneiros em Belém, sobre o que poderia acontecer com a multidão em frente aos quartéis. Falou-se em possibilidades dentro da Constituição, jamais saindo das 4 linhas — afirmou.
Segundo Bolsonaro, a minuta foi passada na tela “de forma bastante rápida” durante uma reunião com o ministro da defesa e o comandante das Forças Armadas. O ex-presidente disse que “o sentimento era de que não havia mais nada a fazer” em relação às eleições.
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— Tivemos que entubar o resultado das eleições — afirmou.
O ex-presidente negou ter tido qualquer intenção de dar um golpe de Estado no país, e afirmou que uma atitude nesse sentido é “abominável”.
— Só tenho uma coisa a afirmar a Vossa Excelência. Da minha parte, ou da parte dos comandantes militares, nunca se falou em golpe. Golpe é uma coisa abominável. O golpe até seria fácil de começar, o after day [dia seguinte] é que seria imprevisível e danoso para todo mundo. O Brasil não poderia passar por uma experiência dessas — frisou.
Protestos e 8 de janeiro
O ex-presidente disse também que não convocou “ninguém para fazer protestos” após perder as eleições de 2022, e que acabou ficando “recluso”.
— No meu governo, nenhum ato atentatório à democracia se fez presente — afirmou.
Além disso, Bolsonaro disse que “não procede que eu colaborei com o 8 de janeiro”, em referência ao atos de 8 de janeiro de 2023 nos prédios dos Três Poderes, em Brasília, e citou discursos pós-eleição para negar golpe.
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— Sempre tem malucos com ideias de AI-5, intervenção militar. As Forças Armadas jamais embarcariam nessa — disse.
Segundo o ex-presidente, quem fazia a ponte com os manifestantes era o general Braga Netto.
— Braga Netto fazia esse elo com os acampamentos. Ele me atualizava, falava que estava tudo tranquilo. Eu ouvia e não falava nada.
Pedido de desculpas a Moraes
No início do depoimento, o ministro Alexandre de Moraes questionou Bolsonaro sobre declarações em que ele insinuou que ministros do STF receberam “milhões de dólares em propina”. O ex-presidente admitiu que “não tem indício nenhum” para sustentar a acusação e pediu desculpas a Moraes.
— Não tem indício nenhum, senhor ministro. Tanto é que era uma reunião para não ser gravada, um desabafo, uma retórica que usei. Se fossem outros três ocupantes eu teria falado a mesma coisa. Então, me desculpe, não tinha essa intenção de acusar de qualquer desvio de conduta dos senhores três — afirmou o ex-presidente.
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O ex-presidente também manteve no depoimento as críticas às urnas eletrônicas, citando ocasiões em que adversários políticos como o atual ministro do STF, Flávio Dino, também teriam questionado o voto eletrônico. Os ataques ao sistema eleitoral foram o motivo que fizeram o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) decretar a inelegibilidade do ex-presidente por oito anos, após acusações sem provas sobre as urnas feitas em reunião com embaixadores estrangeiros, em 2022.
Bolsonaro convida Moraes para ser vice
Em um momento descontraído, Bolsonaro convidou Alexandre de Moraes para ser seu vice em uma eventual candidatura em 2026. A declaração gerou risos na plateia.
O pedido ocorreu quando Bolsonaro perguntou se podia faezr uma brincadeira, e disse:
— Eu gostaria de convidá-lo para ser meu vice em 2026.
Imediatamente, Moraes voltou ao microfone:
— Eu declino novamente – afirmou, sendo sucedido por novas risadas do público.
Quem são os réus
Veja a ordem do interrogatório
- Mauro Cid, delator e ex-ajudante de ordens da Presidência;
- Alexandre Ramagem, deputado federal e ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin);
- Almir Garnier Santos, ex-comandante da Marinha;
- Anderson Torres, ex-ministro da Justiça e ex-secretário de Segurança do Distrito Federal;
- General Augusto Heleno, ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional;
- Jair Bolsonaro, ex-presidente da Reública;
- Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa;
- Walter Souza Braga Neto, ex-ministro da Casa Civil.
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Os réus vêm sendo ouvidos presencialmente na Primeira Turma do STF, pelo ministro Alexandre de Moraes, relator da investigação. Braga Netto é o único que participará por videoconferência, por estar no Rio de Janeiro. As falas são transmitidas ao vivo pela TV Justiça e pelo canal do YouTube do STF.
O interrogatório dos réus marca a reta final da fase de instrução do processo penal. Na sequência, acusação e defesa podem ter prazo para pedir diligências adicionais. Encerrada esta etapa, deve ser aberto o prazo de 15 dias para alegações.
O que pesa contra os réus
Segundo a Procuradoria-Geral da República (PGR), Bolsonaro comandou o “núcleo crucial” da organização que agiu para romper a democracia. Ele é acusado de disseminar ataques ao sistema eleitoral, pressionar militares a apoiarem o golpe e editar um decreto para intervir no TSE. Há ainda indícios de que ele sabia do plano “Punhal Verde Amarelo”, que previa o assassinato de autoridades.
Os outros sete réus são acusados de auxiliar na conspiração. Entre as condutas, estão fraudes eleitorais, bloqueios de estradas para prejudicar eleitores e elaboração de documentos golpistas. Os crimes atribuídos ao grupo incluem tentativa de golpe, organização criminosa e dano ao patrimônio público.
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