A falta de chuvas e a diminuição dos reservatórios têm aumentado a preocupação com o possível risco de um novo apagão no Brasil. A crise hídrica faz o país registrar recordes negativos de armazenamento de usinas hidrelétricas, principal fonte da matriz energética brasileira e responsáveis por 65% da energia elétrica gerada no país.

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A preocupação não surge em vão. Em todo o país, houve uma redução de cerca de 20% na capacidade máxima de armazenamento das usinas hidrelétricas em um ano, passando de 56,5% para 35,4% entre 31 de julho de 2020 e a mesma data de 2021.

A região mais atingida pelo esvaziamento dos reservatórios é o sistema do Sudeste e do Centro-Oeste, que chegou a 26% de armazenamento ao final de julho. O volume é o pior do período histórico, segundo estudo do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), órgão responsável pelo controle da geração e distribuição de energia elétrica no país.

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Para se ter uma ideia, em pleno apagão de 2001, o nível médio dos reservatórios no mês de julho era superior, 26,85%. Para o mês de agosto, o ONS também espera que o nível de armazenamento para o Sudeste e Centro-Oeste seja pior que o de 2001 – a projeção é de 21,4% da capacidade de água neste ano, contra 23,45% do ano do racionamento de energia. Em setembro deve ocorrer a situação mais crítica, com apenas 15,4% do volume de águas na região.

A região Sul, que em outras épocas poderia auxiliar outras localidades do país que tivessem queda nos reservatórios, também enfrenta dificuldades. O submercado da região de Santa Catarina, Rio Grande do Sul e Paraná fechou julho com 47,7% de armazenamento no sistema, também o pior volume já registrado na série histórica do ONS. Em 2020, por exemplo, o Sul tinha 58,3% da capacidade de geração energia disponível.

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Menor volume de chuva em 91 anos no Sudeste

O esvaziamento dos reservatórios é resultado direto do baixo volume de chuvas. Entre setembro de 2020 e agosto de 2021, o sistema do Sueste/Centro Oeste, que responde por 70% da capacidade nacional, registrou chuva equivalente a 64% da média de longo tempo (MLT), indicador usado para comparar com a média histórica de chuva. Foi o pior desempenho da região em 91 anos de série histórica. No Sul, o volume de chuvas nesse período foi o 14º pior, com 61% da média de chuva.

A previsão de especialistas é de que a situação se estenda pelo menos até outubro, quando termina o tradicional período de seca. De novembro a março, os meses costumam registrar chuva, o que deve pelo menos amenizar o problema. No entanto, a dúvida é como o país irá atravessar esses meses, e também se há risco de revisitar o fantasma do desabastecimento.

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O apagão de 2001

A crise hídrica, com falta de chuvas e consequente queda no nível dos reservatórios, aumenta os questionamentos se o Brasil pode voltar a viver um apagão como o de 2001. Naquele ano, a redução dos volumes de armazenamento levou o país a blecautes programados e a um racionamento de energia dos consumidores residenciais e industriais nas regiões Sudeste, Centro-Oeste e Nordeste. Outras ações como redução da iluminação pública e proibição de eventos noturnos também foram tomadas para cumprir uma meta de 20% de redução na demanda de energia elétrica.

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Há chance de um novo apagão no Brasil?

O professor de Engenheiria Elétrica da Universidade do Vale do Itajaí (Univali), Raimundo Celeste Ghizoni Teive, diz que existe risco de racionamento até outubro, já que a previsão de chuva em maior escala é somente a partir desse período no país.

Segundo ele, tudo vai depender da economia.

– Tem que torcer para a economia não deslanchar. É um paradoxo, mas se deslanchar, a economia é a maior consumidora acabaria levando a um crescimento do consumo, e aí poderia não haver capacidade para atender toda a demanda – compara.

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Em entrevista à GaúchaZH nesta segunda-feira (30), o coordenador do Instituto Clima e Sociedade, Roberto Kishinami, afirmou que o país pode ter “apagões localizados” nos grandes centros urbanos a partir de outubro, até o final do ano.

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Embora o governo negue risco de apagão, o próprio ONS já emitiu nota técnica projetando redução dos reservatórios entre setembro e outubro, e afirmando que “em novembro há praticamente esgotamento de todos os recursos”. O órgão propõe medidas como uso de termelétricas e até importação de energia para evitar possível cenário de desabastecimento. 

Campanhas para redução de consumo

Na semana passada, o governo federal lançou uma campanha determinando a redução do consumo de energia em prédios e órgãos públicos.

Na avaliação do professor, o país já está atrasado para iniciativas deste tipo, e até mesmo para campanhas que estimulem também a população a diminuir o consumo.

– Caso não haja uma política de redução de consumo e a economia cresça um pouco acima do que está ocorrendo, aí não haverá geração de energia (suficiente) – conta o professor.

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Nesse cenário, o país poderia reviver em parte o apagão de 2001. Mas há diferenças com a situação de 20 anos atrás. Naquele ano, o sistema ainda não era totalmente integrado e havia dificuldade para transferir energia gerada no Sul, por exemplo, para o Sudeste, que foi quem mais sofreu com o desabastecimento na ocasião. Hoje, 99% do sistema é integrado e haveria mais facilidade na transmissão entre as regiões. O problema desta vez está concentrado na capacidade de geração.

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Horário de verão poderia ajudar?

O horário de verão, que deixou de existir desde que o presidente Jair Bolsonaro assumiu o cargo, em 2019, não é visto como uma medida capaz de resolver a questão da crise hídrica. Primeiro, porque um eventual retorno da estratégia ocorreria a partir de outubro, mês a partir do qual já é esperada uma melhora na situação com um possível retorno das chuvas. Segundo, porque mesmo quando estava em vigor já tinha impacto considerado reduzido no consumo energético, entre 1% e 3%, segundo especialistas.

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Termelétricas e outras fontes para solucionar problema

Nível dos reservatórios em baixa no Sul, Sudeste e Centro-Oeste causam preocupação sobre possível apagão
Nível dos reservatórios em baixa no Sul, Sudeste e Centro-Oeste causam preocupação sobre possível apagão (Foto: Fábio Rodrigues Pozzebom, Agência Brasil)

Com reservatórios das hidrelétricas em baixa, o Brasil precisa novamente recorrer a outras fontes de energia para sustentar a geração capaz de abastecer residências, indústrias e comércios. Apesar do forte apelo sustentável, alternativas como a energia solar e eólica, que vêm ano a ano ganhando espaço na matriz brasileira, têm dificuldades para atender toda a demanda nacional. Assim, o país acaba tendo que apostar no aumento da geração das usinas termelétricas.

– No caso da energia eólica, quando tem vento, gera, quando não tem, não gera. Assim como a fotovoltaica: quando tem radiação, gera, quando não tem, não gera. Não há, no Brasil, um sistema para acumular, em larga escala, fazer estoque dessa energia. Por isso, a solução não pode ser só a eólica e ou só a fotovoltaica. É interessante investir, a eólica já responde por 11% no Brasil, mas ela é sempre complementar. Não se pode esquecer das termelétricas, especialmente a gás, que é menos poluente, porque representa uma energia firme, em que você pode contar com ela quando precisa – afirma.

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Outra solução de médio e longo prazo apontada pelo professor é um formato híbrido de geração de energia. Nesse modelo, usinas e subestações instalam painéis solares flutuantes sobre os reservatórios e geram energia solar nos períodos em que há forte radiação. Dessa forma, os empreendimentos podem poupar os reservatórios de água para atender a demanda em épocas de baixa luz solar, e ainda conseguem reduzir a evaporação dos volumes armazenados.

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Bandeira vermelha ainda mais cara

Como a energia nas termelétricas tem o custo maior de produção, o serviço também fica mais caro para os consumidores. Em julho, o país já teve a aplicação da chamada bandeira vermelha patamar 2, um adicional que serve justamente para custear a diferença do uso das termelétricas, e que teve o valor reajustado em 52%. O valor passou de R$ 6,24 para R$ 9,49 a cada 100 kWh. Mas a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) ainda deve divulgar nos próximos dias um novo reajuste da bandeira 2, que pode levar a cobrança extra a até R$ 15.

Para o professor da Univali, um acionamento das termelétricas quando os estoques das hidrelétricas ainda não estavam tão baixos poderia ter ajudado o país a atravessar os meses de falta de chuvas, até outubro.

– Se tivéssemos três meses atrás usado menos reservatório e mais as termelétricas, o preço iria ser maior, mas conseguiria economizar água do reservatório e ter um cenário mais favorável – avalia.

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Embora indústria e comércio sejam os maiores consumidores e tenham papel decisivo para saber como serão os próximos dois meses de crise hídrica no Brasil, a boa e velha economia do consumidor doméstico também pode ajudar a evitar um cenário mais severo de novo apagão. Apagar luzes desnecessárias, reduzir a duração do banho e outras medidas já incorporadas no campo da economia continuam sendo importantes.

– Se houver falta de energia, vai ser por pouca coisa, então qualquer ajuda é interessante e pode ser suficiente – conta Ghizoni Teive.

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