O desabafo emocionado de uma profissional de saúde mexeu com a rotina de uma cidade catarinense que vive o pico de casos de coronavírus. Após um ano trabalhando na linha de frente da pandemia, sem poder ver a mãe e com um primo entubado na UTI, a auxiliar de enfermagem Ceonara Balen, de 46 anos, chorou e perdeu o controle ao encontrar saindo do mercado uma paciente confirmada com Covid-19. Ela havia acabado de sair do posto de saúde.
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O relato da profissional circulou em toda a cidade de Pinhalzinho, no Oeste de Santa Catarina, que tem no momento mais de 200 casos ativos de coronavírus e tem registrado picos de novas contaminações diárias. Chorando, a auxiliar de enfermagem conta a decepção ao ver pessoas furando o isolamento e espalhando o coronavírus na cidade durante o momento mais duro da pandemia em Santa Catarina. O caso ocorreu no último sábado (27).
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Ouça o desabafo:
— Hoje, depois de mais um dia exaustivo, fui no mercado […] estacionei o carro e vi que estava saindo lá de dentro uma professora que fazia 30 minutos que eu tinha orientado que ela tinha que ficar em isolamento. Eu falei tanto com aquela mulher no posto. Expliquei, orientei, eu dei uma aula para ela de Covid. Eu surtei, eu saí do carro, eu gritei com ela no meio da rua, eu fiz um escândalo. Eu falei para ela que era por causa de gente como ela que a situação está como está. Que a gente estava indo trabalhar com medo de morrer e de quem pode morrer por gente como ela – relata Ceonara no áudio enviado a um grupo de colegas da saúde.
O desabafo da profissional de enfermagem vem em um momento de drama e exaustão. Atendendo dezenas de pacientes com coronavírus todos os dias no posto de saúde em que trabalha, que é a referência para atendimento de suspeitos em Pinhalzinho, Ceonara vê também os efeitos da doença na família. Em entrevista ao Diário Catarinense, ela conta que está com um primo internado na UTI em outra cidade, em situação grave com Covid-19, e uma tia também no hospital com a doença. Além disso, ela não pode visitar a mãe que fez uma cirurgia semana passada.
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— Eu estava no carro conversando com uma prima, falando dos assuntos dos parentes com Covid-19, em situação grave, além da saudade da minha mãe e do stress do trabalho. Eu estava chorando no carro, me acalmando para entrar no mercado. Desliguei o telefone e quando virei para o lado vi a pessoa passando. Foi no impulso, pensando “como assim? Eu te orientei há pouco!”. Ela perdeu o rumo, não imaginou que eu ia encontrar ela ali – conta Ceonara sobre o momento relatado no áudio.
A gente estava indo trabalhar com medo de morrer e de quem pode morrer por gente como ela. Ceonara Balen, auxiliar de enfermagem.
Ela conta que sabe que não deveria ter exposto a paciente na rua, mas agiu em um momento de emoção movido, também, pela urgência de reduzir as contaminações. O dia inteiro, ela e a equipe da unidade de saúde orientam os pacientes com suspeita e confirmação de Covid-19 que devem ficar em isolamento, não sair de forma alguma sob o risco de propagar a doença:
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— É igual a você sair com uma arma dando tiros. As pessoas não estão entendendo, esse processo de contaminação continua e logo não vamos ter onde colocar os pacientes. Vai ter paciente aqui morrendo perto do hospital por falta de leito, por falta de oxigênio.
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Professora foi notificada pelo município e pode pagar multa
A professora com Covid-19 flagrada pela auxiliar de enfermagem no mercado foi notificada pela Vigilância Sanitária de Pinhalzinho no mesmo dia. A informação foi confirmada pelo secretário de Saúde do município, Cleomar Provenci:
— Essa pessoa que descumpriu, assim como qualquer outra que temos relato, se é constatado o descumprimento do isolamento a Vigilância Sanitária notifica, e isso pode virar uma multa. A gente parte do pressuposto que ela está orientada, sabe que deveria ficar em casa, não cabe mais dizer que foi por desconhecimento.
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O secretário afirma também que a prefeitura faz o acompanhamento de todos os casos confirmados pelo telefone, monitorando se estão ou não cumprindo o isolamento dentro do período da infecção. Pela legislação estadual, não há um valor definido de multa para o descumprimento do isolamento e outras medidas sanitárias durante a pandemia, mas o regramento prevê a abertura de processos na Vigilância Sanitária e até mesmo na Polícia Civil.
A auxiliar de enfermagem que emocionou a cidade com o relato diz que o objetivo não é expor ou julgar exatamente a professora, mas sim tratar o caso como um exemplo de todos que descumprem o isolamento e assumem o risco de contaminar outras pessoas:
— Eu não esperava essa repercussão, mas as pessoas no posto que ouviram vieram falar comigo, me deram os parabéns, que tem que fazer isso mesmo. É a única forma de prevenir, de cortar essa contaminação em massa.
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